A
gente é mesmo muito bobo. Insistimos em inventar um ridículo rol de
qualidades infinitas que almejamos na pessoa que escolhemos para
compartilhar a vida. Qualidades essas que, na maioria das vezes, nem
nós mesmos temos.
Cor
do cabelo, posição política, séries favoritas, bairro onde mora,
largura do ombro, filmes que já viu, livros que já leu,
circunferência do quadril, tonalidade dos dentes. Blá-blá-blá.
Uma
lista boba que sabemos que provavelmente nunca será concretizada.
Mas, apesar de sabermos que nosso coração debocha dessas
exigências, acho que elas não são de todo mal. E, desde que bem
selecionadas, podem, de fato, aumentar a probabilidade de um
relacionamento feliz.
Além
dos requisitos óbvios – não beliscar crianças/ não chutar
velhinhos/ não matar pandas/ não votar no Bolsonaro/ não tomar
Fanta Uva –, acho válido estabelecer uma ou outra característica
como referencial.
E,
para mim, há uma característica realmente essencial: essa pessoa
precisa estar disposta a cuidar de você numa virose. Sei que não é
a situação ideal para se pensar num início de relacionamento, mas
a longo prazo isso pode sintetizar uma incrível capacidade de
cuidar, de tolerar, de encarar, de amar.
E
eu não estou falando de febrinha, 37,5, cof-cof. Estou falando de
virose das boas: diarreia, vômito, queda de pressão, 39 de febre,
tremedeira, dores abdominais, vexames e papelões. Sério mesmo.
Encontre
alguém que olhe para você e perceba que há algo de errado antes de
você correr para o banheiro. Alguém que reconheça que aquele seu
silêncio não é só um ar pensativo. Alguém que perceba que você
não está na cama de madrugada e vá conferir o que está havendo.
Encontre
alguém que ligue a TV num volume alto quando você for para o
banheiro com dor de barriga, para você se sentir menos constrangido
com eventuais barulhos. E que grite uns “Tudo bem aí?” quando
você demorar muito. Alguém que te leve um copo de água gelada
depois de te ouvir vomitar e que tente sorrir para te mostrar que
está tudo bem.
Encontre
alguém que, se não souber o que fazer, dê um Google, ligue para a
mãe, procure soluções. Alguém que volte da farmácia com um monte
de tralha. Alguém que compre maçã, batata e torrada. Ou ainda, que
compre um pé de alface e um mamão-papaia, por mais que seja um
baita erro, um erro bruto, mas que tenha sido com a melhor das
intenções.
Encontre
alguém que deixe o telefone do seu lado para emergências. Alguém
que não queira te deixar sozinho nesse estado, mas que, se tiver que
sair, fique com a cabeça em você. Alguém que cancele os
compromissos do fim de semana, se acomode ao seu lado no sofá,
coloque um filme e faça carinhos na sua barriga que ainda faz
“blorgh-blorgh-blorgh”.
Não
procure alguém que te leve flores toda semana, que te dê presentes
caros, que tenha um monte de diplomas pendurados na parede ou um
cabelo incrível para transmitir para seus filhos. Se vier com isso é
bônus, mas esse não é o foco.
Busque
alguém que esteja lá por você. Alguém que olhe para você com
carinho, ainda que você esteja cadavérico. E que, mesmo no contexto
mais desagradável, te arranque um sorriso cansado e te dê a certeza
de que tudo vai ficar bem. Alguém que queira te abraçar mesmo
quando você estiver inabraçável e que te dê a segurança de que o
amor é muito maior do que uma diarreia. O resto a gente ajeita.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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