Valeu
a pena? Valeram a pena estes comentários, estas opiniões, estas
críticas? Ficou o mundo melhor que antes? E eu, como fiquei? Isso
esperava? Satisfeito com o trabalho? Responder “sim” a todas
estas perguntas, ou mesmo a só alguma delas, seria a demonstração
clara de uma cegueira mental sem desculpa. E responder com um “não”
sem excepções, que poderia ser? Excesso de modéstia? De
resignação? Ou apenas a consciência de que qualquer obra humana
não passa de uma pálida sombra da obra antes sonhada? Conta-se que
Miguel Ângelo, quando terminou o Moisés que se encontra em Roma, na
Igreja de San Pietro in Vincoli, deu uma martelada no joelho da
estátua e gritou: “Fala!”. Não será preciso dizer que Moisés
não falou. Moisés nunca fala. Também o que neste lugar se escreveu
ao longo dos últimos meses não contém mais palavras nem mais
eloquentes que as que puderam ser escritas, precisamente essas a quem
o autor gostaria de pedir, apenas murmurando, “Falem, por favor,
digam-me o que são, para que serviram, se para algo foi”. Calam,
não respondem. Que fazer, então? Interrogar as palavras é o
destino de quem escreve. Um artigo? Uma crónica? Um livro? Pois
seja, já sabemos que Moisés não responderá.
José Saramago, in O caderno
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