domingo, 1 de dezembro de 2019

A noite

A luz
tateia em teus olhos:
inundação de lua
em gravidez de pupilas.

Teus dedos temperam a noite
para que nunca mais nasçam manhãs.

Tão lancinante fome
que se esquece de pedir:
antes de seres flor
te colho em fruto.

Tanta sede de lava:
tua boca é água nascente.

O luar em ti me diz:
tudo é última vez.

Teu riso, à despedida:
um girassol
que ama o escuro.

No adeus sem voz
eu escureço, rua abaixo,
e terrestre se vai fazendo o céu.
Mia Couto

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