quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Quase balada (Romance) - (Do morto que amou a morte)

Para as Festas da Agonia
 
Vi-te chegar, como havia
Sonhado já que chegasses:
Vinha teu vulto tão belo
Em teu cavalo amarelo,
Anjo meu, que, se me amasses,
Em teu cavalo eu partira
sem saudade, pena, ou ira;
teu cavalo, que amarraras
Ao tronco de minha glória
E pastava-me a memória.
Feno de ouro, gramas raras.
Era tão cálido o peito
Angélico, onde meu leito
Me deixaste então fazer,
Que pude esquecer a cor
Dos olhos da Vida e a dor
Que o Sono vinha trazer.
Tão celeste foi a Festa,
Tão fino o Anjo, e a Besta
Onde montei tão serena,
Que posso, Damas, dizer-vos
E a vós, Senhores, tão servos
De outra Festa mais terrena —
Não morri de mala sorte,
Morri de amor pela Morte.

ENVOI
Ide, Palavras, cantar,
No mar, nas praias, no porto,
O amor da Morte e do Morto
Que a Vida não quis amar.
Mário Faustino

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