quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Cartas na Rua | 8


Eu tinha as sextas e os sábados livres, o que tornava o domingo o pior dia. Além do fato de que no domingo me obrigavam a estar lá às três e meia em vez do horário usual das 18h18.
Em um desses domingos, entrei e, como sempre, me escalaram para a seção dos impressos, o que significava pelo menos oito horas de pé.
Além das dores, eu começava a sentir tonturas. Tudo começaria a rodar, eu ficaria muito próximo de apagar e então teria de me manter consciente a muito custo.
Tinha sido um domingo brutal. Alguns amigos de Fay tinham aparecido e sentaram no sofá e ficaram grasnando sobre como eram grandes escritores, realmente os melhores de todo o país. A única razão pela qual não eram publicados era porque não enviavam — segundo eles — seus materiais.
Eu tinha olhado para eles. Se escreviam de acordo com suas aparências, seguindo o modo como bebiam seus cafés e davam risinhos e molhavam rosquinhas, então não faria diferença se enviassem seus textos ou os enfiassem no rabo.
Nesse mesmo domingo, eu estivera carimbando revistas. Precisara de café, dois cafés, alguma coisa para morder. Mas todos os chefes estavam de pé bem na minha frente. Tentei a saída dos fundos. Tinha que cruzar direto. O refeitório era no segundo andar. Eu estava no quarto. Havia uma porta junto ao banheiro masculino. Olhei o aviso.
AVISO!
NÃO USE ESTA ESCADA!
Era lorota. Eu era mais esperto que os filhos da mãe. Eles só mantinham aquele aviso para evitar que caras espertos como o Chinaski descessem até o refeitório. Abri a porta e comecei a descer. A porta se fechou atrás de mim. Desci até o segundo piso. Virei a maçaneta. Mas que porra! A porta não abria! Estava trancada. Voltei a subir. Passei pelo terceiro andar. Nem tentei. Sabia que estava trancada. Assim como também estaria trancada a porta do primeiro andar. A essa altura, eu já conhecia os Correios bastante bem. Quando preparavam uma armadilha, iam até o fim. Restava-me uma remota possibilidade. Cheguei ao quarto andar. Tentei a maçaneta. Estava trancada.
Pelo menos a porta ficava ao lado do banheiro. Havia sempre alguém entrando e saindo do banheiro masculino. Esperei. Dez minutos. Quinze minutos. Vinte minutos! Será que NINGUÉM quer mijar, cagar ou fazer um tempo? Vinte e cinco minutos. Então vi um rosto. Bati no vidro.
Ei, parceiro! EI, PARCEIRO!
Nem me ouviu, ou fingiu não me ouvir. Marchou para dentro do banheiro. Cinco minutos. Então outro rosto apareceu.
Bati com toda força.
EI, PARCEIRO! EI, SEU VEADO!
Acho que dessa vez o cara me ouviu. Olhou para mim através do vidro aramado.
Eu disse:
ABRA A PORTA! NÃO ESTÁ ME VENDO AQUI? ESTOU TRANCADO, SEU IDIOTA! ABRA A PORTA!
Ele abriu a porta. Eu passei. O cara parecia estar em estado de transe.
Agarrei seu cotovelo.
Obrigado, garoto.
Voltei para o meu pacote de revistas.
Então o supervisor passou por ali. Parou e me deu uma olhada. Diminuí o ritmo.
Como está indo, sr. Chinaski?
Dei-lhe um grunhido, brandi uma revista no ar como se estivesse enlouquecendo, disse alguma coisa para mim mesmo, e ele seguiu em frente.

Charles Bukowski, em Cartas na Rua

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