Esta
página, por exemplo,
não
nasceu para ser lida.
Nasceu
para ser pálida,
um
mero plágio da Ilíada,
alguma
coisa que cala,
folha
que volta pro galho,
muito
depois de caída.
Nasceu
para ser praia,
quem
sabe Andrômeda, Antártida,
Himalaia,
sílaba sentida,
nasceu
para ser última
a
que não nasceu ainda.
Palavras
trazidas de longe
pelas
águas do Nilo,
um
dia, esta página, papiro,
vai
ter que ser traduzida,
para
o símbolo, para o sânscrito,
para
todos os dialetos da Índia,
vai
ter que dizer bom-dia
ao
que só se diz ao pé do ouvido,
vai
ter que ser a brusca pedra
onde
alguém deixou cair o vidro.
Não
é assim que é a vida?
Paulo Leminski, in Toda Poesia
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