quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Vovó Cochise

Todas as manhãs, mamãe me confiava a minha avó, que na adolescência apelidei de Cochise, em homenagem a um célebre chefe indígena.
A avó, portanto.
Era ela o chefe supremo da família. Como uma guerreira apache, fazia valer a lei de ferro sobre suas tropas dispersas. Quase cega, vovó Cochise se quedava ereta e imóvel, atrás de um véu invisível para os outros. Era uma mulher robusta de traços finos, mirrada pela velhice. Tinha a audição, o paladar e o olfato melhores que os de todo mundo. Sua testa era devastada por rugas, sua face mais amarrotada que a pele de um camaleão. Suas sobrancelhas se franziam assim que ela escutava minha voz fina. Tinha o faro de um cão perdigueiro e me farejava antes de me reconhecer. Bastava ela estender os braços e me agarrar pela pele da nuca como uma gata faz com seu gatinho. Sem esforço, ela me punha no colo. E eu só podia fazer uma coisa: agarrar-me a ela para me acalmar. Não devia me mexer nem derramar uma lágrima. Mas era impossível. Eu havia nascido com os olhos úmidos e vermelhos. Não resistia muito tempo. Implacável, a sanção caía sobre meus ombros.
Cada fungado era seguido de um olhar sombrio e ameaçador. Cada choro, de uma reprimenda. Depois, de golpes de bengala na cabeça, nas clavículas, nos calcanhares. Com um golpe seco, ela sabia me fazer gritar de dor. Eu soluçava, soluçava até sufocar. Os dias se sucediam e eram iguais, naquela época. Eu continha a respiração. Eu lançava meu espírito bem longe como um laço. De cansaço, caía no meio da manhã e enfim adormecia. Os olhos da avó se fixavam nos raros transeuntes cujos passos ela intuía muito antes de eles chegarem até nós. Aqueles homens e mulheres não deixavam de cumprimentar a matrona, que balançava a cabeça depois de cada saudação.
O passante: Como vai o pequeno?
Ela: O Clemente vela por ele; hoje não temos do que nos queixar.
O passante: E os seus velhos ossos?
Ela: Se eles estalam é porque estão vivos.
O passante: Pelos Anjos do Céu, a senhora vai enterrar a todos nós, não é verdade?
Ela: Pode contar com isso.

A tigela de mingau que eu havia ignorado ficava de lado ainda por algum tempo. Quinze minutos depois, fazia a felicidade de algum menininho ou de alguma menininha da vizinhança. Por essa vez, a Avó, solicitada por uns e outros, não me repreendia. Aproximadamente às dez da manhã, a agitação no bairro mudava de patamar. Mamãe chegava do mercado. Ela pegava um tamborete e se aproximava da velha para lhe dar notícias de um parente convalescente, transmitir um recado do imã do bairro ou se queixar do aumento do preço da carne. Vovó a escutava. Nada parecia afetá-la.
Eu não tinha direito a um só olhar de minha mãe. Encolhido aos pés de Vovó Cochise, eu tremia de febre. Sentia rancor daquela mãe que mantinha distância de meu pequeno corpo raquítico na esteira. Tentava me acalmar para dar razão a minha avó e perturbar ainda mais mamãe. Contemplava de um ponto de vista próprio os passantes na rua. Tinha uma vista incrível de uma paisagem singular: as unhas atrofiadas dos dedos dos pés de minha avó.
Eu estava com 45 anos quando você entrou na minha vida, Béa. Filha do desejo, você esperou o tempo necessário antes de vir ao mundo com grande fanfarra.
Quando criança, eu jamais havia tido animal de pelúcia, de palha ou de papelão. Não era um bebê sadio, forte e bem nutrido como você. Era magro e doentio. Para que eu parasse de chorar, só havia uma solução. Minha mãe fez esta descoberta por um acaso extraordinário. As grandes descobertas científicas, como a aspirina ou a pasteurização, são filhas do acaso, sabe-se lá por quê. Uma noite em que estava cansada de me ouvir gemer, minha mãe me imergiu na água fria de uma bacia branca na varanda. Hoje revejo a cena com certa emoção. Ao relatá-la, calafrios agitam meu corpo todo. As lágrimas quase me vêm aos olhos.
Antes de ser posto na bacia, eu havia tido a impressão de sufocar, a garganta fechada. O que se seguia terminava sempre da mesma maneira: eu tremia de frio, a água fresca amaciava minha pele. Se minha mãe havia chegado a essa solução radical, é que ela recorrera a todos os estratagemas possíveis sem conseguir acalmar o bebê chorão que eu era. À noite, antes de me deitar na minha pequena esteira, ela me contava toda sorte de histórias. Contos sobre meninos obedientes, outros sobre animais dóceis ou plantas afetuosas. As histórias se encadeavam. Nós éramos os dois únicos seres a se agitar enquanto toda a cidade dormia à solta.

Quando você nasceu, Béa, um detalhe me chamou a atenção: você tinha orelhas grandes, um pouco como Barack Obama. Seu pequeno rosto era marcado por seus grandes cílios. Você se mexia muito. Tremendo, examinei seus membros. Graças a Deus você era saudável.
Sob o efeito da dor, ainda meio inconsciente, sua mãe rompe enfim as brumas que a envolviam para me perguntar o sexo do bebê.
Eu, orgulhoso como um pavão: “É uma menina!”.
E você gritou pela segunda vez.
Você se esgoelava por qualquer motivo.
Fazia questão de que sua mãe e eu comêssemos na palma da sua mão. Em matéria de mistura explosiva, você é campeã em todas as categorias. Ao sangue suíço-milanês de sua mãe, acrescente-se meu sangue africano, que não é nada preguiçoso, porque todos os meus antepassados eram nômades e, ainda hoje, eles continuam a ganhar de todo mundo na corrida a pé.

Abdourahman A. Waberi, in Por que você dança quando anda?

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