“Poesia,
minha tia, ilumine as certezas dos homens e os tons de minhas
palavras. É que arrisco a prosa mesmo com balas atravessando os
fonemas. É o verbo, aquele que é maior que o seu tamanho, que diz,
faz e acontece. Aqui ele cambaleia baleado. Dito por bocas sem dentes
e olhares cariados, nos conchavos de becos, nas decisões de morte. A
areia move-se no fundo dos mares. A ausência de sol escurece mesmo
as matas. O líquido-morango do sorvete mela as mãos. A palavra
nasce no pensamento, desprende-se dos lábios adquirindo alma nos
ouvidos, e às vezes essa magia sonora não salta à boca porque é
engolida a seco. Massacrada no estômago com arroz e feijão a quase
palavra é defecada ao invés de falada. Falha a fala. Fala a bala.”
Paulo
Lins, in Cidade de Deus
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