Estava
estudando fora do Brasil (início da década de 1970), no Instituto Pedagógico da França, era bolsista e comecei a sentir
saudade do Brasil.
Morava
perto de um jardim que tinha um lago. No fim de semana, sentava-me
neste jardim para ler e sentia saudade do Brasil, de comer feijoada,
de dormir na cama com lençol passado, dos meus amigos.
Nunca
pensei em ser escritor. Um dia, pensei: por que você não pensa em
uma coisa que nunca pensou? E tinha o lago e sempre vinha um peixe e
botava a cabeça do lado de fora. Havia várias gaivotas que
mergulhavam no lago e tornavam a sair. Comecei a olhar aquilo e a
pensar que cada coisa tinha um lugar. Se o peixe saísse fora da
água, morreria afogado no ar. Mas se a gaivota ficasse dentro da
água, morreria afogada. Comecei a olhar os dois elementos da
natureza e descobri uma coisa que achei bonita: tanto o peixe quanto
o pássaro não deixa rastro por onde passa. Não ficam caminhos. Ele
chega, se instala naquele lugar e todo vazio é caminho. E toda a
água é caminho. Fiquei encantado com o peixe e o pássaro por não
deixarem rastro.
Então,
escrevi o texto O peixe e o pássaro para aliviar a minha saudade. Quando volto ao Brasil, entro em um concurso
— a primeira edição do prêmio João de Barro, da Prefeitura de
Belo Horizonte. Mandei meu texto e ganhei o prêmio. Não sabia que
era escritor. Ganhei o prêmio e fiquei feliz, pois tinha um
dinheiro. Fiquei mais feliz ainda porque um dos jurados era a
Enriqueta Lisboa, que me telefonou para dar a notícia. Ela quis me
conhecer e ficamos muito amigos.
Havia
um crítico literário no Jornal do Brasil que
se chamava Dom Marcos Barbosa. Ele leu O peixe e o pássaro e escreveu uma crônica, aconselhando o Carlos Drummond de Andrade a
ler o meu livro, pois era uma receita para viver no mosteiro.
Esse
foi um texto que escrevi para mim mesmo. Para me fazer carinho
naquela solidão que sentia em Paris. Hoje, brinco muito ao afirmar
que escrevemos para fazer carinho na gente. Tem horas que a única
coisa que posso fazer por mim é escrever. Fazer um pouco de carinho
em mim.
Bartolomeu
Campos de Queirós,
in Palestra no Teatro do Paiol, Curitiba – PR
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