Já
está mandando aquele que sempre serviu
A
mulher beija a barra de prata com os lábios, com a testa, com os
peitos, enquanto o padre lê em voz alta a carta de seu marido, Juan
Prieto, escrita em Potosí. Quase um ano levaram a carta e o lingote
para cruzar o oceano e chegar a Valladolid.
Diz
Juan Prieto que enquanto os outros gastam seu tempo em bebedeiras e
touradas, ele não aparece nas tabernas nem na arena de touros, que
em Potosí por qualquer coisinha metem os homens a mão na espada e
sopra ali um vento de pó que arruína a roupa e enlouquece os
ânimos. Que ele não pensa mais que no regresso à Espanha e que
agora manda esta barra grande de prata para que possam ir construindo
o jardim onde se celebrará o banquete de boas-vindas.
O
jardim haverá de ter um duplo portão de ferro e um arco de pedra
largo o suficiente para que passem as carruagens dos convidados à
festa. Será um jardim cercado de muros, de altos muros sem nenhuma
abertura, cheio de árvores e flores e coelhos e pombas. No centro
haverá de ter uma grande mesa com manjares, para os senhores de
Valladolid a quem ele tinha servido, anos atrás, como criado. Terá
um tapete sobre a grama, junto à poltrona da cabeceira, e sobre o
tapete deverão sentar-se sua mulher e sua filha Sabina.
Encarece
muito à esposa que não tire o olhar de sua Sabina e não permita
que nem o sol a toque, pois por buscar-lhe bom dote e boa boda passou
ele todos estes anos nas Índias.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
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