Dizem os frades:
Chegou ao México há vinte anos. Duas
pombas a guiaram até Guanajuato. Sem um arranhão chegou, embora
tenha cruzado o mar e atravessado o deserto e tenham-se extraviado os
que a traziam. O rei a mandou para nós, em gratidão pelas riquezas
que a jorros brotam, sem nunca cessar, das entranhas destes montes.
Durante mais de oito séculos, ela
tinha vivido na Espanha. Sobreviveu escondida, oculta dos mouros, em
uma gruta de Granada. Quando os cristãos a descobriram a resgataram,
não encontraram em seu corpo de madeira nenhuma ferida. Intacta
chegou a Guanajuato. Intacta continua, fazendo milagres. A pobres e
ricos consola da pobreza. Nossa Senhora de Guanajuato; e do frio
salva os que dormem na intempérie ou em abrigado palácio. Em sua
infinita indulgência, não distingue servos de senhores. Não há
quem a invoque e não receba o favor divino.
Por sua graça estão se salvando,
agora, muitos índios de Guanajuato que a ela acodem com
arrependimento e fé. Ela deteve a espada do Senhor, que com justa
fúria castiga nestes dias idolatrias e pecados dos índios do
México. Não foram tocados pela peste os infelizes que a ela
elevaram suas súplicas e pagaram a devida esmola.
Nas demais comarcas, morre de fome ou
de pena o índio que não foi morto pelo tifo. Há cadáveres nos
campos e nas praças e estão cheias de mortos as casas onde,
morrendo todos, não ficou quem corresse para dar aviso. Por todo
México vem erguendo a peste tal cheiro de podridão e fogueiras que
temos de andar, os espanhóis, com os narizes tapados.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
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