O
chalé fazia parte da gente. Me lembro do Bilu, com o seu perfil
perpendicular de cegonho sábio, o longo bico mergulhado — não no
gargalo do gomil da fábula, não propriamente no canecão de chope,
que era de fato o que estava acontecendo —, mas no poço artesiano
de si mesmo.
Me
lembro do Reynaldo, redondo, pacato, amável, tão amável, pacato e
redondo que parecia um desses personagens de romance policial que
ninguém desconfia que seja o autor do último crime da mala.
Me
lembro do Cavalcanti, com a sua cara silenciosa e receptiva de
mata-borrão.
Me
lembro de mim, silencioso. Sim, a determinada hora éramos todos
silenciosos... essa hora em que não é preciso dizer nada, nem mesmo
o verso inesquecível de Valéry: “Oh mon bon compagnon de
silence!”
Este
silêncio era apenas quebrado quando chegava o Athos, o Athos
centrífugo e pirotécnico. Mas isto não perturbava o nosso
silêncio, nem o próprio silêncio do Athos... Pois havia um
profundo e misterioso rio de silêncio que corria subterraneamente a
todas as nossas palavras.
Era
o rio da poesia?
O
rio da harmoniosa confusão das almas?
Agora
é apenas o rio do tempo que passou.
Mário Quintana, in Caderno H
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