Ei você!
Você, que passou cerca de 15 anos da sua
vida fugindo das aulas de educação física. Enfermaria, cantina,
banheiro, qualquer escapatória era válida.
Você, que quando não conseguia fugir
era sempre o último a ser escolhido para compor as equipes para
jogar bola.
Até por isso, a única modalidade na
qual você se dava minimamente bem na escola era queimado, porque a
única coisa que precisava fazer era fugir da bola, sua especialidade
até os dias de hoje.
Os anos passaram e você se livrou desse
inferno. Que alívio.
Ou não.
Agora, se bobear, piorou: você paga uma
academia sem que ninguém te obrigue a isso. E eu sei bem como é ser
uma dessas pessoas que se sentem mais à vontade num terreiro de
candomblé, num centro cirúrgico ou numa mina de sal do que numa
academia. É realmente um sacrifício.
O pânico já começa na hora de se
vestir. Se você é mulher, entrar num legging dá mais medo do que
entrar em estacionamento de shopping perto do Natal. Quando enfia os
pés dentro dele, sua sensação é de que precisava de um número 11
vezes maior e de que se você entrar naquilo nunca mais vai sair, nem
com vaselina.
Se você é homem, dry fit é um
termo absolutamente desconhecido e sua tendência natural é ir à
academia sensualizando de moletom cinza com elástico na barra e
camiseta de vereador. E, em ambos os casos, gastar mais do que 150
reais num tênis soa como uma verdadeira aberração. (“Gente, com
150 reais dá pra comer TAAANTO hambúrguer!”)
Muito bem, se você vence essa etapa, o
que em muitos casos nem chega a acontecer, o negócio começa a ficar
sério.
O problema já começa pelo verbo. Você
se sente muito ridículo dizendo que vai “treinar”. Cara, eu nem
tenho um treino. “Malhar” é pior ainda, fora de cogitação. Sua
tendência é dizer que vai “fazer ginástica”, mas não dá, a
não ser que você vá até a década de 1990 para se exercitar. O
jeito é “ir para a academia” mesmo, com o máximo de dignidade
possível.
Então você chega naquele local nefasto,
faz uma breve oração para que ninguém te dirija a palavra enquanto
você estiver lá dentro, respira fundo, pensa em fugir pro boteco da
esquina, mas fica firme e entra.
Segue direto para uma esteira – não
pode ser tão difícil assim –, sobe e, ao apertar “iniciar”,
já bate um semipânico daquele tranco que o aparelho dá quando
começa a funcionar.
Mas você sobreviveu; está caminhando,
orgulhoso. Então, cinco minutos depois, percebe que está na
velocidade 3,6 e a senhora de 95 anos ao seu lado na 6,0. Coloca em
7,5 para não ficar tão feio, mas não sabe se é pra andar rápido,
trotar ou correr, por isso começa a fazer movimentos estranhos, um
pouco semelhantes aos de um orangotango.
Primata ou não, você conseguiu chegar a
20 minutos. E é claro que esses 20 minutos demoraram 7 horas para
passar, enquanto você se perguntava como aquele filho da mãe na
esteira ao lado estava há 53 minutos na velocidade 11,5.
Mas é isso aí. Você conseguiu e até
já se imagina falando para o mundo, com a maior naturalidade, que já
fez sua “corrida” hoje. Praticamente uma São Silvestre. E lá
vai você para a musculação, fingindo não estar tão perdido
quanto hare krishna em baile funk, bebendo sua água numa garrafinha
de plástico fosco que ganhou do banco há 13 anos, enquanto vê as
pessoas com um tipo de Nescau em copos da Nasa (“ Whey que fala,
né?”). Senta-se numa máquina vazia qualquer. Mal sabe se aquilo é
pra perna, braço, abdômen ou se é um caixa eletrônico. Espeta
aquele pino num peso que te parece honesto e sai empurrando a
primeira alavanca que vê. Está pesado demais, o negócio nem se
movimenta. Vê se não tem ninguém olhando e espeta o pino mais para
cima. Tenta de novo. Nada. Coloca o pino no mínimo. Faz nove
repetições e se sente pronto para o octógono do UFC. Procura
halteres. Vai para a frente do espelho (“Céus, pareço um imbecil
nessa roupa”) e começa a trabalhar bíceps. Ou tríceps. Tanto
faz, você não sabe qual é qual. De repente, quase enfarta por
causa de um fortão que, depois das repetições, jogou os pesos no
chão e o barulho foi tipo o apocalipse. E nem dá para você se
vingar porque pesos de 2kg não fazem barulho se caírem.
Enfim. Pode ser que você tente fazer uma
aula. Zumba, step, jump. A probabilidade de dar certo é de cerca de
1 em 497. Então, aqui vão duas dicas:
1. Fique no fundo. BEM no fundo. Se
possível, atrás de uma pilastra e com aqueles óculos de disfarce
que já vêm com um bigode.
2. Quando, na coreografia, você achar
que é pra ir para a direita, vá para a esquerda e quando achar que
é para a esquerda, vá para a direita. Costuma funcionar. Mas,
cuidado: se tiver uma “voltinha” ou uma viradinha de 360 graus na
coreografia, não faça. Vá por mim, experiência própria. Quando
você voltar ao ponto inicial a música já vai ter mudado ou, se
bobear, aquela aula já acabou e já está rolando uma sessão de
yoga. Sério, não faça isso.
Não é fácil, eu sei. Ainda mais se
estiver chovendo. Ou frio. Ou muito calor. Ou uma bela noite de
verão. Ou se for Dia do Índio. Ou se for época de carambola.
Qualquer desculpa é desculpa.
Mas é isso aí, vamos tentando, porque
depois dos 25 ninguém mais está com a vida ganha.
E chega o dia em que o medo do espelho,
da balança e das fotografias é maior do que o medo da academia. E
então estaremos salvos. Vai dar tudo certo.
Se cuidem, blogueiras fitness, tô na
área.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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