De mim mesmo sei
pouco. E olhando com serenidade a paisagem chego à conclusão de que
é agradável sim, mar, areia, mas o que eu vejo justifica o estar
aqui permanentemente? Resposta: você é livre para sair. Aí é que
estão enganados. Ser livre para sair é assim: você chega senta se
acomoda, e o outro diz: você é livre para sair. Ainda que você não
queira você sai. É por isso que eu fico aqui. Ficando aqui não sou
livre. Saindo, muito menos. Liberdade abre as asas sobre nós, tem
poesia isso, mas isso sufoca, vejo sempre uma águia gigante roubando
o espaço acima da minha cabeça, vejo sempre a asa me comprimindo, e
por isso eu gostaria de voar porque subiria acima dessa
eventualidade. Escuridão e cárcere. Ratazanas. Vida subindo pelos
pés, vida chegando até o peito, vida na boca, a minha boca aberta
sugando vida, eis algumas frases que de repente grito na noite, e nem
sei bem o que tudo isso quer dizer, depois grito mais: sei tão pouco
de ti, amiga morte, mas tremo tremo sabendo que tu só visita os
vivos.
Hilda Hilst,
in Kadosh
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