Às
vezes se ouve uma coisa que não entendo, que não consigo entender.
É quando um escritor diz: “Meu único compromisso é com a minha
obra”. Não entendo isso, realmente não entendo… Pois ninguém
no mundo, na vida, pode dizer que seu único compromisso é com
aquilo que faz. Um sapateiro não diria isso, e não entendo por que
eu deveria me expressar de uma forma diferente e específica de estar
comprometido na sociedade com alguma coisa. Não entendo como poderia
estar comprometido apenas com aquilo que faço. Na verdade, tenho de
estar comprometido com aquilo que os outros fazem, e com as
consequências daquilo que faço e do que os outros fazem; e essas
consequências estão no marco da sociedade. A velha torre de marfim:
“Estou aqui, criando, produzindo sem saber nem sequer qual é o
destino dessas obras-primas”… Realmente não entendo. Mas, claro,
aceito isso, embora deva dizer que, para mim, no meu caso, não me
serve.
José
Saramago, in As palavras de Saramago
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