“Cada
um dos indivíduos da espécie Homo sapiens, única existente
hoje em dia da família dos hominídeos, do gênero Homo,
espécie esta que ocupa uma posição especial na natureza”, diz o
dicionário.
Ser
humano é complicado.
Obra
de Deus, sobra do Big Bang, descendente do macaco, filho do
acaso, talvez.
Descobriu
o fogo, inventou a roda, foi primata, caçador, rei, servo,
cavaleiro, filósofo, artista, guerreiro, explorador, pirata, poeta,
aristocrata, carrasco, vítima, mocinho, fanático, machista,
mascate, banqueiro, revolucionário, democrata, bandido, economista,
prisioneiro, astronauta, funcionário público, feminista, hippie,
rico, pobre, banido, favelado, empresário, desiludido, evangélico,
capa de revista, e lá vai ele mudando com o tempo.
Suas
principais características:
1.
A postura vertical.
2.
O polegar das mãos oposto aos outros dedos.
3.
O volume do cérebro.
4.
O uso da linguagem articulada.
5.
O desenvolvimento da inteligência, especialmente das faculdades de
generalização e de abstração.
6.
Outras.
7.
O hábito de sair pra beber, ou de jantar fora, ora em grupo, ora em
casais, ora na mais absoluta solidão.
Ser
humano é esquisito.
Tem
de todo tipo.
O
boteco, por exemplo, está cheio deles. Um vive uma desgraça, um
comemora o sucesso, um abraça uma morena, um toma a oitava cerveja,
um estuda as meninas que passam, um até arrisca um gracejo, um
descobre que é hora de ir pra casa. A mulher está esperando, hoje é
sexta, e toda sexta, bem, você sabe.
Ser
humano é tão bonito.
Num
restaurante francês, um casal levemente embriagado de champanhe
repete a mesma cena clássica: as bocas se colam, os olhos se fecham,
o escuro roda.
— Peço
outra?
Num
cantinho, no forró, dois se entregam.
No
Baixo Gávea, dois disputam a mesma moça. (De repente eles são
três, daqui a pouco serão quatro.)
Ser
humano é fogo, sabia?
O
pessoal do escritório toma saquê no japonês enquanto discute a
alta do dólar.
No
baile funk, a namorada de um comenta com a de outro que eles
não são de nada.
No
balcão do bar de sempre, um qualquer, abandonado pela mulher, chora.
No
bar da frente, lotado, uma mulher separada tenta se convencer de que
é mais feliz agora.
Na
Feira de São Cristóvão, um toma outra cachaça somente pra dar
coragem. Ser humano é triste, um dia ou outro.
Mas
lá no macrobiótico, toda contente, uma garota mostra pra outra sua
nova tatuagem.
Na
churrascaria, felizmente, uma família inteira comemora mais um
aniversário.
A
galera do cursinho, no mesmo mexicano, todo dia, bebe marguerita
frozen, pula, gira, fica, troca, o mundo muda.
Ser
humano é engraçado.
Na
boate GLS, um casal meio deslocado tenta se divertir. Está na moda.
Porque
leu que faz bem pra saúde, um toma diariamente um copo de vinho
tinto.
Porque
vinha tonto há meses, um deu um tempo na bebida e anda mais
desanimado.
Ser
humano é assim mesmo.
É
bem bacana?
É
um problema?
Hoje
é uma coisa. Amanhã é outra. De repente não é mais aquilo.
Às
vezes, ser humano é humanamente impossível.
Difícil.
Incrível. Estranho. Doido. Doído. Ótimo. Péssimo. Mais ou menos.
Animado.
Ser
humano é tudo isso.
Fora
o resto todo, é claro.
Adriana
Falcão, in O doido da garrafa
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