segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

E ainda temos alguma verdade para dizer?

Hoje estamos vivendo em um Brasil feio. Não gosto do Brasil em que vivo hoje. Um Brasil que só fala de números. O Brasil vai bem porque a economia vai bem. Mas e nós, o povo? Nós estamos bem? Estamos seguros, respeitados? Estamos dignamente humanos? Temos uma escola boa, uma saúde boa? Temos uma segurança boa? O Brasil vai bem porque a economia vai bem. Mas e eu não conto? Sou apenas um número? Estudei na física que o planeta não tem nem luz própria. Olha que coisa terrível morar em um planeta que não tem nem luz própria. Estamos em uma periferia do cão. E para ter o dia e a noite você nem precisa de uma estrela de primeira grandeza. Uma estrela de quinta grandeza, como o Sol, serve. Resolve isso numa boa. E ainda temos alguma verdade para dizer? É só a dúvida que nos une, que nos aproxima. É só disso que precisamos. Precisamos de amparo com a nossa dúvida. E a literatura nos ampara. Tenho muito medo da verdade. Não acredito que haja nada verdadeiro. Tive um professor de filosofia, o padre Henrique Vaz, para quem eu perguntei “o que era a fé”. Ele me respondeu que a fé é a dúvida. Tem dias que você tem muita, tem dias que tem pouca, tem dias que não tem nenhuma. Isso se chama fé, porque nos é possível somente a dúvida. Hoje, estamos com muita gente encontrando a verdade. Quando uma pessoa encontra a verdade, a única coisa que ela adquire é a impossibilidade de escutar o outro. Ela só fala, não escuta mais. Quem encontra a verdade só fala.
Bartolomeu Campos de Queirós, in Palestra no Teatro do Paiol, Curitiba - PR

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