O
tempo passou lento e tranquilo, como deve passar, eu acho, em todos
os desertos do mundo. Eu estava por fazer treze anos, usava minissaia
(recém-inventada por Mary Quant) e continuava contando meus filmes.
Tinha
cada vez mais público.
Havia
crianças que recebiam dinheiro de seus pais para irem ao cinema, e
preferiam vir para a minha casa, fazer uma doação mínima e gastar
o resto em bobagens. E muitos adultos analfabetos, quando o filme era
“com letras”, escolhiam ouvi-lo contado por mim em vez de ir ao
cinema e não entender nada. E descobri também que tinha gente que
vinha me ouvir não porque não pudesse pagar a entrada do cinema,
mas porque o que gostavam de verdade era que alguém contasse os
filmes.
Alguns
diziam que eu era tão boa para caracterizar os personagens que, só
com piscar os olhos, podia passar da expressão de candidez de Branca
de Neve à ferocidade do leão da Metro Goldwyn Mayer. E que me ouvir
era como ouvir aquelas radionovelas que eram transmitidas dia a dia
lá da capital, pois, além de imitar vozes e fazer caras, eu sabia
manter a plateia em suspense.
Naquele
tempo descobri que todo mundo gosta que alguém conte histórias.
Todos querem sair da realidade um momento e viver esses mundos de
ficção dos filmes, das radionovelas, dos romances. Gostam até que
alguém lhes conte mentiras, se essas mentiras forem bem contadas.
Essa é a razão do êxito dos embusteiros de fala hábil.
Sem
nem ter pensado nisso, para eles eu tinha me transformado numa
fazedora de ilusões. Numa espécie de fada, como dizia a vizinha.
Minhas narrações de filmes os tiravam daquele amargo nada que era o
deserto, e mesmo que fosse por um instante os transportava a mundos
maravilhosos, cheios de amores, sonhos e aventuras. Em vez de vê-los
projetados numa tela, em minhas narrações cada um podia imaginar
esses mundos ao seu bel prazer.
Certa
vez li por aí, ou vi num filme, que quando os judeus eram levados
pelos alemães naqueles vagões fechados, de transportar gado – com
apenas uma ranhura na parte alta para que entrasse um pouco de ar –,
enquanto iam atravessando campos com cheiro de capim úmido,
escolhiam o melhor narrador entre eles e, subindo-o em seus ombros, o
elevavam até a ranhura para que fosse descrevendo a paisagem e
contando o que via conforme o trem avançava.
Eu
agora estou convencida de que entre eles deve ter havido muitos que
preferiam imaginar as maravilhas contadas pelo companheiro a ter o
privilégio de olhar pela ranhura.
Hernán Rivera Letelier, em A contadora de Filmes
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