7
Então
comecei a chegar em casa infeliz.
— Qual
é o problema, Hank?
Eu
tinha de beber toda noite.
— É
o gerente, o Freddy. Ele começou a assobiar uma música. Ele a
assobia quando eu chego de manhã e não para nunca, e continua a
assobiá-la até a hora de eu ir para casa à noite. Há duas semanas
está nessa!
— Qual
é o nome da música?
— Around
the World in Eighty Days. Nunca gostei dessa música.
— Bem,
arranje outro emprego.
— Farei
isso.
— Mas
continue trabalhando lá até arranjar outro. Precisamos provar para
eles que...
— Tudo
bem. Tudo bem!
8
Certa
tarde, encontrei um velho bêbado na rua. Eu o conhecia dos tempos de
Betty quando fazíamos as rondas dos bares. Ele me disse que agora
era um atendente nos Correios e que não havia nada como aquele
emprego.
Era
uma das mentiras mais gordas do século. Tenho procurado esse cara há
anos, mas temo que outra pessoa o tenha alcançado primeiro.
De
modo que lá estava eu fazendo mais uma vez o exame para o serviço
civil. A diferença é que desta vez, no formulário, marquei
“atendente” e não “carteiro”.
Ao
receber a notificação de que deveria me apresentar para as
cerimônias de admissão, Freddy havia parado de assobiar Around the
World in Eighty Days, mas eu estava ansioso para pegar aquele
empreguinho frouxo que o “Tio Sam” me oferecia.
Eu
disse a Freddy:
— Tenho
um pequeno negócio para resolver e pode ser que leve uma hora, uma
hora e meia no almoço.
— Beleza,
Hank.
Mal
sabia eu como seria longo aquele almoço.
9
Formávamos
um bando de gente por lá. Uns 150 ou 200. Havia uma porção de
papéis tediosos a preencher. Depois disso, ficamos todos de pé de
frente para a bandeira. O sujeito encarregado do juramento era o
mesmo da vez anterior.
Após
o juramento, o cara nos disse:
— Muito
bem, agora vocês têm um bom emprego. Não se metam em confusão e
terão segurança para o resto de suas vidas.
Segurança?
Isso é algo que você pode conseguir na cadeia. Três metros
quadrados, nada de aluguel a pagar, nenhum bem de consumo, imposto de
renda, criança para sustentar. Nenhuma taxa de licenciamento de
carro. Nenhuma multa. Nenhuma detenção por dirigir bêbado. Nenhuma
perda nas corridas de cavalo. Assistência médica gratuita.
Camaradagem com aquelas pessoas com os mesmos interesses. Igreja.
Enterro grátis.
Aproximadamente
doze anos mais tarde, desses 150 ou 200, restariam apenas dois de
nós. Assim como alguns caras não podem ser motoristas de táxi,
cafetões ou traficantes, a maioria dos caras, e das garotas também,
não podia ser atendente dos Correios. E eu não os culpo. Com o
passar dos anos, vi como entravam continuamente em esquadrões de 150
ou 200 e só dois, três ou quatro restavam de cada grupo — apenas
o suficiente para substituir aqueles que se aposentavam.
10
O
guia nos levou para conhecer o prédio todo. Havia tantos de nós que
tiveram que nos separar em grupos. Pegávamos o elevador por turmas.
Nos mostraram a cafeteria dos funcionários, o porão, todas aquelas
cretinices.
Deus
Todo-Poderoso, pensei, queria que esse cara se apressasse só um
pouco. Meu horário de almoço já acabou há duas horas.
Então
o guia entregou um cartão-ponto a cada um de nós. E nos mostrou
onde ficava o relógio.
— Agora
prestem atenção. É assim que vocês devem bater o ponto.
Ele
nos mostrou como fazer. Depois disse:
— Vamos,
é a vez de vocês.
Doze
horas e meia mais tarde nós o bateríamos de novo. Foi uma senhora
cerimônia de iniciação.
Charles Bukowski, in Cartas na Rua
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