sábado, 24 de junho de 2023

Terra | Caetano Veloso, 1978



Em 1978, depois de 14 anos de ditadura militar, o presidente Ernesto Geisel prosseguia com uma polêmica abertura política por ele chamada de “lenta, gradual e segura”. Mesmo enfrentando uma facção linha-dura do Exército que queria tomar o poder, esse processo levaria ao desmanche da rede subterrânea de tortura, com a demissão do general responsável pela morte do jornalista Vladimir Herzog, e também a um início de abrandamento da Censura prévia.
Terra” foi a canção de abertura do extraordinário LP Muito (Dentro da estrela azulada), que Caetano lançou naquele ano, com clássicos como “Sampa”, “Muito romântico” e “São João Xangô menino”. Sua letra dizia o que até então não podia ser dito: “Quando eu me encontrava preso / na cela de uma cadeia”, referência à sua prisão junto com Gilberto Gil, em dezembro de 1968, que os levou ao exílio em Londres.
Foi em 1969, quando estava preso no Rio, que Caetano viu uma foto da Terra no espaço feita por um satélite artificial. Pela primeira vez o planeta em todo o seu esplendor azul e feminino, ao “não vê-la nua mas sim coberta de nuvens”. Do confinamento abjeto somos transportados ao amor à liberdade e à grandiosidade cósmica do planeta em alguns versos.
Depois, Caetano brinca com a interação de signos astrológicos com planetas no espaço, apaixonado “por uma menina terra, signo de elemento terra”, se dizendo “um leão de fogo / que sem ti me consumiria a mim mesmo eternamente”.
A canção, que se desenvolve em clima denso, com frases musicais sinuosas, não foi um sucesso popular, mas provocou profunda emoção em crítica e público, marcando um tempo de reinício e de esperanças.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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