quarta-feira, 1 de março de 2023

Hollywood | 3

O telefonema seguinte de Jon Pinchot veio três ou quatro dias depois. Ele conhecia Danny Server, o jovem diretor-produtor que tinha um estúdio cinematográfico completo em Venice. Danny ia emprestar-nos sua sala de projeção para a gente ver o documentário de Pinchot, A Besta que Ri, sobre um governante negro que fazia o que queria, com sangrento prazer. Primeiro, tínhamos de encontrar Pinchot para uns drinques. E assim, estávamos de volta ao cais dos barcos a vela...
Jon atendeu à porta e Sarah e eu entramos. Ele não estava só. Tinha um cara lá, com uns cabelos estranhos: pareciam louros e brancos ao mesmo tempo. Rosto rosado, mais para vermelho. Olhos de um redondo azul alucinado, muito redondos, muito azuis. Parecia um colegial pronto para fazer uma terrível travessura. Eu saberia depois que jamais perdia essa aparência. A gente gostava dele de saída.
Este é François Racine – disse Jon. – É ator de muitos de meus filmes, e de outros.
E nos outros, me pagam... – François fez uma mesura. – Como vão?
Jon saiu para pegar as bebidas.
Me perdoem, por favor – disse François –, acabo num instante.
Sobre a mesa, via-se uma pequena roda de roleta, de controle eletrônico, que era posta a girar apertando-se um botão. François tinha um monte de fichas e uma longa folha de papel cheia de cálculos. Havia também um tapete de apostas. Ele colocava as fichas, apertava o botão, dizia:
É a minha Dama da Cabeça Giratória. Estou apaixonado.
Jon apareceu com os drinques.
Quando não está jogando de fato, François está treinando, ou pelo menos pensando na coisa.
A roda parou e François arrecadou seu prêmio.
Estudei as permutações da roda, e saquei – disse François. – Assim, onde quer que ela pare, já adivinhei e ganho.
E o sistema dele funciona – disse Jon –, mas quando chega nos cassinos ele não se mantém dentro do sistema.
Muitas vezes sou derrotado pelo Desejo de Matar – explicou François.
Hank joga – disse Sarah. – Nos cavalinhos. Está lá todo dia de corrida.
François me olhou.
Ah, os cavalinhos! Você ganha?
Me agrada pensar que sim...
Ah, podemos ir um dia?
Claro.
François retornou à sua rodinha, e nós nos sentamos com nossos drinques.
Ele já ganhou e perdeu centenas de milhares – contou-nos Jon. – Só quer ser ator quando está na pior.
Faz sentido – eu disse.
A propósito – disse Jon. – Falei com o produtor Harold Pheasant, e ele está muito interessado no argumento. Está disposto a entrar com grana pro filme.
Harold Pheasant! – disse Sarah. – Já ouvi falar dele. É um dos maiores produtores do ramo.
Certo – disse Jon.
Mas eu não escrevi um argumento – contestei.
Não importa. Ele conhece o que você escreve. Está disposto.
Não parece plausível.
Ele trabalha muitas vezes assim, e só faz faturar.
Jon foi buscar a garrafa.
Talvez você deva escrever o argumento – sugeriu Sarah.
Veja o que aconteceu com F. Scott Fitzgerald.
Você não é Fitzgerald.
Não, ele deixou de beber. Isso o matou.
François ainda estava à sua roletinha. Jon apareceu com a garrafa.
A gente toma mais uma e vai.
Legal – eu disse.
Escuta, François, você vem com a gente? – perguntou Jon.
Oh, não, me perdoem, por favor, preciso pesquisar mais um pouco aqui…

Charles Bukowski, in Hollywood

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