sexta-feira, 22 de maio de 2020

Sazonais eternidades



Abres-me, janela,
e antigas memórias
me salpicam o rosto,
chuvas ainda por desabar.

Escancaradas portadas,
devolvem-me o corpo,
esse mesmo corpo
que, para febre e desejo,
em outro corpo acendi.

Abres-me, saudade
e o tempo se descalça
para atravessar
incandescentes brasas.

E quando,
de novo, me encerras,
volto a dormir
como dormem os rios
em véspera de serem água.

A saudade
é o que ficou
do que nunca fomos.
Mia Couto

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