Martin é capaz de coisas de
que sou incapaz. De abordar qualquer mulher em qualquer rua. Devo
confessar que, desde que conheço Martin (e isso faz bastante tempo),
tenho me aproveitado muito desse talento do meu amigo, pois gosto de
mulheres tanto quanto ele, mas não possuo sua impetuosa audácia.
Por outro lado, poderia censurar Martin por fazer da abordagem um
exercício de virtuosismo considerado como um fim em si e, muitas
vezes, não ir mais adiante. É por isso que ele se compara, não sem
certa amargura, ao generoso atacante que dá bons passes para um
companheiro de equipe, fazendo-o assim marcar gols fáceis e colher
glórias sem grande esforço.
Na segunda-feira daquela
semana, ao sair do trabalho à tarde, eu estava esperando por ele num
café da praça São Venceslau, absorvido na leitura de um grosso
livro alemão sobre a antiga cultura etrusca. Foram necessários
muitos meses para que a biblioteca da universidade conseguisse para
mim o empréstimo dessa obra na Alemanha. Naquele dia eu estava
acabando de recebê-la; trazia-a comigo como uma relíquia e no fundo
estava muito contente com o atraso de Martin, pois assim poderia
finalmente folhear numa mesa de café o tão desejado livro.
Não posso evocar essas
velhas culturas antigas sem uma espécie de nostalgia. De nostalgia e
inveja, ao pensar sem dúvida na suave lentidão da história naquele
tempo. A antiga cultura egípcia ocupa muitos milênios, a
antiguidade grega durou perto de mil anos. Sob esse aspecto, a vida
do ser humano como indivíduo é uma imitação da história humana:
a princípio mergulhada numa imóvel lentidão, depois acelerando aos
poucos e cada vez mais. Martin faria quarenta anos dentro de dois
meses.
Milan
Kundera,
in Risíveis
amores
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