Quem
quer que examine a causa final do mundo discernirá uma
multiplicidade de usos que chegam a fazer parte desse resultado.
Todos eles admitem ser incorporados a algumas das seguintes classes:
Bens Materiais, Beleza, Linguagem e Disciplina.
Sob
o nome geral de Bens Materiais, incluo todas as vantagens que nossos
sentidos devem à natureza. O que, é claro, trata-se de um benefício
temporário e mediato, tal qual seus serviços para a alma. Ainda que
módico, é perfeito em seu gênero, e a única utilidade da natureza
que todos os homens apreendem. A miséria do homem parece uma
petulância infantil quando exploramos a firme e pródiga provisão
que tem sido feita para seu suporte e delícia nessa bola verde que o
faz flutuar através dos céus.
Que
anjos inventaram estes esplêndidos ornamentos, estas ricas
conveniências, este oceano de ar acima, este oceano de água abaixo,
este firmamento de terra entre os dois?
Este
zodíaco de luzes, esta tenda de nuvens respingantes, esta malha
listrada de climas, este quádruplo ano? Feras, fogo, água, pedras e
milho o servem. O campo é a um só tempo o seu piso, sua oficina,
seu jardim e sua cama.
“Mais
servos esperam ao homem Do que ele tomará conhecimento.”
A
natureza, em sua cooperação com o homem, é não só o material,
mas também o processo e o resultado. Todas as partes trabalham
incessantemente nas mãos umas das outras para o proveito do homem. O
vento espalha a semente; o sol evapora o mar; o vento sopra o vapor
para o campo; o gelo, do outro lado do planeta, condensa neste a
chuva; a chuva sustenta a planta; a planta sustenta o animal; e,
assim, as contínuas circulações de caridade divina nutrem o homem.
As
artes práticas são reproduções ou novas combinações criadas
pelo engenho do homem, a partir dos mesmos benfeitores naturais. Este
já não precisa esperar as brisas favoráveis: graças à máquina a
vapor, torna realidade a fábula do saco de Éolo e transporta os
duzentos e trinta ventos na caldeira de seu barco. Para reduzir a
fricção, pavimenta o caminho com barras de ferro, e, subindo a um
vagão carregado de homens, animais e mercadorias, lança-se a
percorrer o país de povo em povo, como uma águia ou uma andorinha
pelo ar. E, tudo somado, como chegou a mudar a face da Terra desde a
era de Noé até a de Napoleão! O homem pobre tem cidades, barcos,
canais, pontes. Vai ao correio, e a raça humana leva seus recados; à
livraria, e a raça humana lê e escreve para ele acerca de tudo o
que acontece; aos tribunais, e as nações reparam seus agravos
pessoais. Levanta sua casa no caminho, e a raça humana vai todas as
manhãs, de pá na mão, retirar a neve para lhe dar passagem.
Mas
não há necessidade de elementos específicos nessa categoria de
usos. O catálogo é interminável, e os exemplos tão óbvios, que
eu devo deixá-los para a reflexão do leitor, com a observação
geral de que este benefício venal diz respeito a um bem adicional.
Um homem é alimentado, não por poder ser alimentado, mas por poder
trabalhar.
Ralph
Waldo Emerson, in Natureza - A Bíblia do
Naturalismo
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