segunda-feira, 14 de abril de 2025

De velhas e novas tábuas

8.

Quando há pranchas sobre a água, quando passarelas e parapeitos se erguem sobre a corrente: então ninguém acredita, em verdade, naquele que diz: “Tudo flui”.
Pelo contrário, até os imbecis o contradizem. “Como”, dizem eles, “tudo flui? Passarelas e parapeitos estão acima do que flui!”
Acima do que flui está tudo firme, todos os valores das coisas, pontes, conceitos, todo o ‘bem’ e o ‘mal’: tudo isso está firme!” —
Mas, quando vem o duro inverno, o domador de rios, até mesmo os mais espirituosos aprendem a desconfiar; e, em verdade, não apenas os imbecis falam então: “Não deveria tudo — ficar parado?”.
No fundo está tudo parado” — eis um verdadeiro ensinamento invernal, uma boa coisa para tempos infecundos, um bom consolo para os que hibernam e ficam junto à estufa.
No fundo está tudo parado” —: mas contra isso prega o vento do degelo!
O vento do degelo, um touro que não é boi de arado — um touro raivoso, um destruidor, que com chifres furiosos rompe o gelo! Mas o gelo — — rompe passarelas!
Ó meus irmãos, agora não se acha tudo a fluir? Não foram por água abaixo todos os corrimãos e passarelas? Quem ainda se agarraria a “bem” e “mal”?
Ai de nós! Viva nós! O vento do degelo sopra!” — Assim pregai, ó meus irmãos, por todas as ruas!

Friedrich Nietzsche, em Assim falou Zaratustra

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