sábado, 11 de janeiro de 2025

Minha avó, meu acô

Quando a avó trocou o coração por um electrodoméstico, continuou amando. Estava tão acostumada, fazia já do amor uma coisa plenamente racional. Amava por lucidez. Ela dizia: amar é saber.
E dizia: amar é melhorar.
Tantas vezes me repreendeu quando rabujei ou abreviei um abraço. Ordenava apenas: melhora, rapaz. Melhora.

O meu avô, ao contrário, era um homem de oficina. Para ele, a vida era uma tarefa. Havia que cumprir, plantar, colher, assear, ter modos, manter o silêncio, poupar palavras.
Usava todas as distâncias e fugas. A maioria das vezes, só a minha avó o encontrava, metido em lugarejos debaixo das árvores, por onde ia fazer cálculos e afiar foices. Dava-se com os cães. Todos um pouco ferozes. Dormiam também ao sol a sossegar.
[...]

Valter Hugo Mãe, em Serei sempre o teu abrigo

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