terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Nada será como antes | Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1971


Gravada em 1971 por Joyce, num compacto com o grupo A Tribo, formado por Nelson Ângelo, Naná Vasconcellos, Toninho Horta e Novelli, e logo depois por Elis Regina, “Nada será como antes” entrou no mundo das canções eternas no álbum duplo Clube da Esquina, em 1972. Ela é uma das muitas preciosidades lapidadas por Milton Nascimento com Ronaldo Bastos (1948), um carioca nascido em Niterói que integrou, ao lado de Fernando Brant e Márcio Borges, a fundamental troika de parceiros que o carioca mais mineiro do mundo alternou na sua carreira luminosa. Durante a década de 1970, no período mais intenso da dupla, Milton e Ronaldo também assinaram “Cais”, “Fé cega, faca amolada”, “Cravo e canela” e “Circo Marimbondo”.
Com sua pegada pop, a música revelava o amor de Milton e seus parceiros pelos Beatles e companhia, que eram execrados pela MPB ortodoxa da época. A letra de Ronaldo refletia o turbulento período político que o Brasil atravessava, com a repressão aterrorizando a juventude e o perigo escondido em cada esquina, quando a vida na estrada passou a ser uma opção para tantos jovens insatisfeitos com o estado de coisas. A outra era cair na clandestinidade e na luta armada.
Além das possíveis esperanças da estrada, premonitoriamente, a canção também parecia anunciar que nada mais seria igual na música brasileira após o álbum duplo feito por Milton Nascimento & Lô Borges e quase duas dezenas de compositores, arranjadores e intérpretes, que entrou para a história como Clube da Esquina. Uma reunião informal de amigos e talentos que, sem planos, receitas ou restrições culturais, misturou samba, jazz, rock, bolero, abrindo uma riquíssima terceira via para a música brasileira, que seria uma das mais influentes nas décadas seguintes.
O sucesso de “Nada será como antes” mostrou sua perfeita sintonia com o momento, e logo a canção também começou a ser reconhecida fora do Brasil. Inicialmente entre os músicos de jazz, que adotaram a versão para o inglês de Rene Vincent, “Nothing Will Be As It Was”, lançada no álbum Milton (1976), gravado em Los Angeles, ao lado de Wayne Shorter, Herbie Hancock, Hugo Fattoruso e Airto Moreira. E seguiu com o pé na estrada, nas vozes jazzísticas de Sarah Vaughan, Flora Purim e Tânia Maria.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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