Quando
escrever é uma arma que só a dor e a delícia de ser o que é sabe
apertar o gatilho.
“É
um erro lê-los, para uma mulher, pois ela inevitavelmente procurará
algo e não encontrará”, afirma uma das maiores romancistas
inglesas do seu tempo com base na tal teoria dos dois lados da mente,
sobre a consciência da própria virilidade na escrita masculina. Em
outras palavras, alude como os homens escrevem apenas com o lado
masculino do cérebro. O trecho reflexivo pertence ao seu
livro-ensaio “Um teto todo seu”, publicado em 1929, baseado em
uma série de palestras que deu em duas escolas para mulheres na
Cambrigde University.
Virginia
Woolf vai construindo na sua biografia de barco em tempestade, uma
história de escrita feminina. Caracterizada por ser uma autora
difícil e visceral, a grafia para ela era algo infernal mas que de
contratempo mantinha sua vitalidade. Um refúgio nos livros, uma
salvação na literatura. Por entre vezes, em seus diários, armas
nos quais se auto criminava, diz se sentir perto do precipício.
“Todos os escritores são infelizes. As pessoas sem palavras é que
são felizes'”.
Os
mitos têm uma vida dura. Nascida em uma teto onde as cabeças são
obtusas e acordais, sua família burguesa tradicional dentro da
normalidade seguia no paternalismo da sociedade britânica das
aparências. Ser uma moça encantadora é uma vantagem. Tudo a
repulsa. Virginia aguentaria no dia a dia a tirania masculina dos
“machos vitorianos” que se estendiam ao autoritarismo, submissão,
maus tratos e limitação intelectual. “Convive com essas três
espécimes (seu pai, cujo mais reprova, mas o que é desculpado pela
idade e seus dois irmãos George e Gerald, nos quais não admite a
burrice como casos desesperados) dessa raça cujo desaparecimento
deseja ardentemente”, rubrica a autora jornalista de sua biografia
Alexandra Lemesson.
Sintetizando
os termos elementares da história, sujeito, discurso e poder em uma
discussão foucaultiana, Woolf estaria com o termo Dispersão, como
afirma o livro de J.J Domingos, uma parte de sua dissertação de
mestrado, “Discurso, Poder e Subjetivação: Uma discussão
Foucaultiana”. O pensamento de que esses conceitos, não são mais
“o lugar de repouso, da certeza, da reconciliação, do sono
tranquilizador”. A subjetivação das lutas do discurso da Virginia
Woolf vaga por entre seus diários e obras pincelando sua vida como
algo a se descobrir em descontínuo.
Fugindo
a tirania doméstica do pai, escreve: “Enquanto as mulheres forem
economicamente dependente dos homens elas o serão também
espiritualmente”. Assim, Virginia começará a construir um teto
seu dentro do teto patriarcal no número 22 da Hyde Park Gate. No
segundo andar, ela junto a sua irmã Vanessa, escondem seu
temperamento bélico e fomentam sua revolta e resistência contra a
sistemática dos machos vitorianos. Vão pintar, ler desenhar e
escrever. Sonhar juntas o que era oprimido do ser. Falando sobre a
singularidade de duas vidas: Em baixo executavam tarefas banais
atribuídas as boas aparências: servir chá, preparar refeições
entre outros. Em cima, eram aquilo além do que se bastavam em um
mundo de homens.
Aos
poucos, entre um ofício no jornalismo literário de jornais e
revistas e o sucesso de suas obras, embasa o que lhe foi apetecido na
sua construção do seu lado feminino do cérebro e aplicado em uma
literatura dominada pelo patriarcado, exercendo influências em
comunidades feministas e LGBTTT. Ao lado de um pai que acreditava que
só os meninos deveriam ser enviados para a escola, ela resiste e
ocupa na interrogação de uma educação formal para mulheres e sua
posição vassala na sociedade.
Desenvolveu
sua intelectualidade no grupo de Bloomsbury, nomeado pelo bairro no
qual as suas irmãs haviam se mudado e se reuniam com amigos,
discutindo não só intelectualidades formais, mas sim a cordialidade
de ser humano. Assim ela se dissipava de suas coerções morais e
experimentava a atmosfera de liberdade que parecia ser felicidade. Em
pouco tempo, conhece o seu porto, Leonard Woolf, que futuramente será
seu marido e o amor da sua vida.
A
loucura, ansiedade, depressão, alucinações e demência foram um
cenário da vida e escrita de Virginia Woolf. Convencida de sua
incapacidade de escrever e atravessar outro episódio de demência.
Escreve duas cartas perturbadas. Uma para seu marido outra para sua
irmã. O último episódio de sua vida é na manhã dia 28, porém
uma decisão mastigada em vários dias. Não é algo que deseje.
Apenas quer a paz. E é nessa busca por ser livre que ela pega seu
casaco e sua bengala e sai até as águas do rio Ouse. Enche os
bolsos de pedras e resiste as ondas como se fosse um barco e navegar
fosse preciso sem mais tempestades. Acha um lugar pra descansar a
cabeça.
Assim
como Leminski, “Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é,
ainda vai nos levar além”. Virginia foi além do que é sem nunca
partir, apenas remando a navegar com o vento do seu próprio moinho
como dizia Cartola.
Ribamar
Júnior, in lounge.obviousmag.org
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