quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

A bênção final

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Tem ar e sol, e tem nuvens. Lá em cima um céu azul e talvez atrás dele existam canções; talvez melhores vozes... Há esperança, enfim. Há esperança para nós, contra o nosso penar.
Mas não para você, Miguel Páramo, que morreu sem perdão e não alcançará graça alguma.”
O padre Rentería deu as costas e entregou a missa ao passado. Apressou-se para terminar logo e saiu sem dar a bênção final para aquela gente que lotava a igreja.
Padre, queremos que o abençoe para nós!
Não! — disse ele mexendo a cabeça e negando. — Não vou fazer isso. Foi um homem ruim, e não entrará no Reino dos Céus. Deus irá me levar a mal se eu interceder por ele.
Dizia isso, enquanto tentava conter as mãos para que não mostrassem seu tremor. Mas foi.
Aquele cadáver pesava muito na alma de todos. Estava sobre um tablado, no meio da igreja, rodeado de círios novos, de flores, de um pai que estava atrás dele, sozinho, esperando que terminasse o velório.
O padre Rentería passou ao lado de Pedro Páramo procurando não roçar seus ombros. Levantou o aspersório com gestos suaves e orvalhou a água benta de alto a baixo, enquanto de sua boca saía um murmúrio que podiam ser orações. Depois se ajoelhou e todo mundo se ajoelhou com ele:
Tem piedade do teu servo, Senhor.
Que descanse em paz, amém — responderam as vozes.
E quando ele começava a se encher de raiva de novo, viu que todos saíam da igreja levando o cadáver de Miguel Páramo.
Pedro Páramo aproximou-se, ajoelhando-se ao seu lado:
Eu sei que o senhor o odiava, padre. E com razão. O assassinato do seu irmão, que pelo que se rumoreja por aí foi cometido pelo meu filho; o caso da sua sobrinha Ana, que o senhor acha que foi violada por ele; as ofensas e faltas de respeito que ele às vezes teve com o senhor são motivos que qualquer um pode reconhecer. Mas esqueça isso agora, padre. Pense e perdoe como talvez Deus já tenha perdoado.
Pôs sobre o genuflexório um punhado de moedas de ouro e levantou-se:
Receba isso como uma ajuda para a sua igreja.
A igreja já estava vazia. Na porta dois homens esperavam Pedro Páramo, que se juntou a eles, e juntos seguiram o féretro que aguardava descansando sobre os ombros de quatro caporais da Media Luna.
O padre Rentería apanhou as moedas uma por uma e se aproximou do altar.
São tuas — disse. — Ele pode comprar a salvação. Tu saberás se o preço é este. Quanto a mim, Senhor, me ponho aos teus pés para pedir o justo ou o injusto, que tudo nos é dado pedir... Por mim, condena-o, Senhor.
E fechou o sacrário.
Entrou na sacristia, jogou-se num canto, onde chorou de pena e de tristeza até esgotar as lágrimas.
Está bem, Senhor, tu ganhas — disse depois.
Juan Rulfo, in Pedro Páramo

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