terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Missão Impossível

Eu sabia que a guerra no Golfo ia sobrar pra mira. O telefone me acordou às cinco da manhã.
Frank falando.
Frank é meu nome. Frank Drebin, tenente aposentado do Esquadrão de Polícia, disposto a terminar seus dias, principalmente, de súbito.
Frank, aqui é o George Bush.
A mania de fazer graça dos cariocas.
Certo, palhaço. Conta outra.
É sério, Frank.
Ah, vai pro caralho!
Uma hora depois bateram no meu quarto. Um cara da CIA, velho conhecido do Vietnã, reclamando que eu tinha ofendido o presidente dos Estados Unidos da América. Me desculpei. Ele disse que eu receberia instruções no dia seguinte, na filial Tijuca da Tele Rio. Não estranhei. O Brasil é um país muito louco. Toda a minha vida fui Mister isso e Mister aquilo, mas o ascensorista do hotel só me chama de Pretinha, Minha Flor, Princesa...
Como eles mesmos dizem: é de lascar!
Well, passei outro vexame na tal loja. O gerente, um baixinho parecido com o Ozires Silva, deu um berro assim que me viu:
Oba! Você deve ser o tal agente secreto, ou coisa que o valha! Tô com uma fita pra você, gracinha!
Piscava o olho de um jeito sagaz e me dava cotoveladas. Tinha “ordens superiores” pra me vender um walkman. No táxi, a caminho do hotel, aproveitei o engarrafamento pra ouvir a fita:
Um, dois, três, gravando! Tá no ar? “Tanto tiempo disfrutamos desse amor”. Bela voz, não? Cantei no Sílvio. Teu recado é o seguinte: procure um índio de cueca Zorba, assobiando o tema de P antanal, na seção de importados do Paes Mendonça. Essa gravação se auto destruirá em cinco seg - seg -seg - seg...
Tecnologia brasileira. Graças ao defeitinho a geringonça explodiu nos meus cornos. Tive queimaduras de primeiro, segundo e terceiro graus e fui medicado no Pronto - Socorro do Andaraí, onde tu entra cajá e sai caqui.
Cheio de picrato de butezin, ossos do ofício, deixei o hospital e passei em meu hotel. Levei o maior susto. Seis homens ensaiavam um seqüestro no saguão, pro Globo Repórter. Pra não ser notado, dei seis tiros numa senhora. Ninguém viu, o que é uma tradição nessa gente bronzeada.
Não achei outro táxi. Pra não perder a hora fui de chapa branca pro Paes Mendonça. O índio tava lá. Resolvi improvisar. Um ligeiro aceno de minha parte e o índio resmungou:
Ugh!
E eu:
Hefner.
Ele, de mau humor:
Onde eu perder as flechas?
E eu, brilhante:
Deep in the heart of Texas.
Ele:
Vai pro caralho.
Fiquei perplexo.
What?
Vai pro caralho.
Tenho certeza de que não havia nada disso nas minhas instruções. Quase entrei em pânico. Aí, vi outro índio de cueca Zorba, assobiando o tema de Pantanal, me fazendo sinais desesperados com uma latinha de caviar.
É um mundo pequeno.
Novas ordens me levaram ao gabinete de segurança máxima do Tuma, em Brasília. Uma sofisticada fortaleza, impossível de transpor se você não tem os meios adequados. Um bunker à prova de falhas, apesar de o entregador do Mister Pizza ter interrompido a reunião com duas calabrezas. Começou a discussão pra saber quem tinha feito o pedido. Saí pelos fundos. Tinha que voar com urgência pra São Paulo. Durante o vôo, devido à tensão, me senti mal. Uma aeromoça, filiada à CUT, ia passando na horinha.
Young lady…
Tsk...
Coffe, please.
Qualé, babaca? Tá me achando com cara de garçon? Vai pro caralho!
Assim, não há mulato inzoneiro que agüente.
Próximo passo: eu precisava decifrar uma mensagem em código, durante uma palestra do Mário Amato, na Fiesp, sobre economia de mercado. É dose. Tava quase cochilando quando quatro capitães da Polícia Militar, munidos de bombas de flit, começaram a jogar dados e a dar umbigadas enquanto pisoteavam um japonês com um papagaio no ombro. A mensagem era cristalina: “Não tem mosquito. Dados oficiais: encontro às 4 P.M., na Baixa do Sapateiro, com um oriental. Senha: Currupaco”.
Adoro Salvador. Ia acender o terceiro baseado quando vi o japa. Cheguei de fininho e mandei no ouvido dele:
Currupaco.
Sei que é chocante, mas o Tanaca me olhou do cabelo escovinha ao tênis e disse:
Vai pro caralho!
A última mensagem que recebi, antes de entrar pras Testemunhas de Jeová, dizia que Saddam Hussein é mineiro de Goiabinhas e que eu deveria, pra maiores esclarecimentos, localizar, a qualquer preço, um compositor baiano parecido com Bob Marley.
Pera lá, Pentágono! São mais de vinte mil! Vai pro caralho!

Aldir Blanc, in Brasil passado a sujo

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