segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

A terra prometida

Maldormidos, nus, machucados, caminharam noite e dia durante mais de dois séculos. Iam buscando o lugar onde a terra se estende entre juncos e taquaras.
Várias vezes se perderam, se dispersaram e tornaram a juntar-se. Foram virados pelos ventos e se arrastaram amarrando-se uns em outros, golpeando-se, empurrando-se; caíram de fome e se levantaram e novamente caíram e se levantaram. Na região dos vulcões, onde não cresce erva, comeram carne de répteis.
Traziam a bandeira e a capa do deus que tinha falado aos sacerdotes, durante o sono, e tinha prometido um reino de ouro e plumas de quetzal: Sujeitareis de mar a mar todos os povos e cidades, havia anunciado o deus, e não será por feitiço, e sim por ânimo do coração e valentia dos braços.
Quando se aproximaram da lagoa luminosa, debaixo do sol do meio-dia, os astecas choraram pela primeira vez. Ali estava a pequena ilha de barro: sobre o nopal, mais alto que os juncos e as palhas bravas, estendia a águia suas asas.
Ao vê-los chegar, a águia humilhou a cabeça. Estes párias, apinhados na margem da lagoa, imundos, trêmulos, eram os eleitos, os que em tempos remotos tinham nascido da boca dos deuses.
Huitzilopochtli deu-lhes as boas-vindas:
Este é o lugar de nosso descanso e nossa grandeza – ressoou a voz. – mando que se chame Tenochtitlán a cidade que será rainha e senhora de todas as demais. México é aqui!

Eduardo Galeano, in Os Nascimentos

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