sexta-feira, 5 de junho de 2020

Ieoana, uma moça grega


Apresentaram-me a uma moça grega, que veio a Paris estudar cinema. Moça, digo, pela idade aparente. Porque é casada. Senhora Kórax, ou Hiérax, ou Skolópax; só sei que um nome de ave. Porém seu prenome é Ieoana. De começo, brincou de não dizê-lo:
... Ainda se fosse Fríni, ou Khlói, autênticos nomes helênicos...
Cloé... Frineia... Beijocleia...
Que diz? É em sua língua? É belo. Soa-me ainda mais grego…
. . .
Mas a vida, salvo seja, surpreende-nos. Ieoana, a amiga grega, de quem há dias não sei, tem a ideia de chamar-me. Cilada: mal dou minha voz, ela se põe de lá a falar, coisas impalpáveis, em seu fino idioma. Desentendo; espero. E ela parola, parla, lala, gregueja, greciza, verso ou prosa, sem pausa. De repente, pós um dual e um aoristo, desliga. E, quando chamo, minha vez, não atende seu telefone.
Guimarães Rosa, in Ave, Palavra

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