sábado, 16 de maio de 2020

Comércio


Os famas instalaram uma fábrica de mangueiras e contrataram numerosos cronópios para o enrolamento e o depósito. Mal os cronópios chegaram ao local, tiveram uma enorme alegria. Havia mangueiras verdes, vermelhas, azuis, amarelas e roxas. Eram transparentes e ao experimentá-las se via correr a água com todas suas borbulhas e às vezes um inseto espantado. Os cronópios começaram a dar grandes gritos e queriam dançar trégua e dançar catala em vez de trabalhar. Os famas se enfureceram e logo aplicaram os artigos 21, 22 e 23 do regulamento interno. A fim de evitar a repetição de tais fatos.
Como os famas são muito descuidados, os cronópios esperaram circunstâncias favoráveis e carregaram muitas e muitas mangueiras no caminhão. Quando encontravam uma menina, cortavam um pedaço de mangueira azul e lhe davam de presente para que ela pudesse pular mangueira. Assim, em todas as esquinas viram-se nascer belíssimas borbulhas azuis transparentes, com uma menina dentro que parecia um esquilo na jaula. Os pais da menina desejavam tirar-lhe a mangueira para regar o jardim, mas se soube que os astuciosos cronópios as haviam furado de forma que a água se desmanchava dentro delas e não servia para nada. No fim os pais da menina desistiam e a menina ia à esquina e pulava e pulava. Com as mangueiras amarelas os cronópios enfeitaram diversos monumentos, e com as mangueiras verdes espalharam armadilhas à moda africana em pleno roseiral, para ver como as esperanças caíam uma por uma. Os cronópios dançavam trégua e dançavam catala em redor das esperanças caídas, e elas lhes censuravam a ação dizendo assim:
Cruéis cronópios cruentos. Cruéis!
Os cronópios, que não desejavam mal algum às esperanças, as ajudavam a levantar e lhes presenteavam pedaços de mangueira vermelha. Dessa maneira, as esperanças puderam ir às suas casas e cumprir o mais veemente de seus desejos: regar os jardins verdes com mangueiras vermelhas.
Os famas fecharam a fábrica e ofereceram um banquete cheio de discursos fúnebres e criados que serviam peixe em meio a grandes suspiros. E não convidaram nenhum cronópio, convidaram só as esperanças que não tinham caído nas armadilhas do roseiral, porque as outras ficaram com pedaços de mangueira e os famas estavam zangados com essas esperanças.
Julio Cortázar, in Histórias de Cronópios e de Famas

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