Por
que o poeta disse e todos repetem “Verde que te quero verde”?,
pensava Clô. Por que não dizer “Verde que te quero azul”, ou
“Roxo que te quero verde”?
Clô
pensamenteava nisso porque estudava tapeçaria e desejava uma cor que
fosse outra cor, por transparência, reflexo ou calculada ilusão
visual. Clô brincava de tapeçaria, esta a verdade. Queria uma
composição que fosse outra.
O
anjo da guarda de Clô achou que não estava direito, e toda noite
corrigia a trama, retificando as cores no seu devido padrão, e nada
de modernices. Era um anjo acadêmico, meio rixoso.
Ela
só percebeu a interferência do anjo porque, acordada, viu a hora em
que ele alterava a tecedura de ponto grosso, impondo o desenho
clássico, na cor devida. Furiosa, atirou-se ao anjo. Os dois
travaram luta desigual, pois os braços dele eram deslizantes e
ardentes, suas unhas luminosas tanto se cravavam na tapeçaria como
nos braços de Clô.
A
obra ficou destruída, e desde então a moça pensa em outras coisas.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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