quarta-feira, 6 de março de 2019

15/10/91 - 00:55

Demolido. Umas duas noites bebendo esta semana. Tenho que admitir que não me recupero tão rápido como antes. A melhor coisa de estar cansado é que você não se sai (ao escrever) com nenhuma proclamação extravagante e maluca. Não que seja ruim, exceto se isso se tornar um hábito. A primeira coisa que se deve fazer ao escrever é salvar seu próprio rabo. Se fizer isso, automaticamente será gostoso, divertido.
Um escritor que conheço está ligando para as pessoas, dizendo que escreve cinco horas por noite. Imagino que tenhamos que ficar maravilhados com isso. Claro, será que vou ter que repetir pra vocês? O que interessa é o que ele está escrevendo. Será que ele conta o tempo que fala ao telefone como parte de suas cinco horas escrevendo?
Consigo escrever de uma a quatro horas, mas a quarta hora se esvai em quase nada. Conheci um cara que me disse uma vez: “Fodemos a noite toda”. Não é o mesmo cara que escreve cinco horas por noite. Mas já se encontraram. Talvez devam se alternar, trocar. O cara que escreve por cinco horas fode a noite toda, e o cara que fode a noite toda escreve durante cinco horas. Ou talvez possam foder um ao outro enquanto outra pessoa escreve. Eu não, por favor. Que a mulher escreva. Se houver uma...
Humm... sabe, estou me sentindo um pouco idiota esta noite. Fico pensando em Máximo Gorky. Por quê? Não sei. De certa forma, parece que Gorky nunca existiu de verdade. É possível acreditar que alguns escritores realmente existiram. Como Turgueniev ou D. H. Lawrence. Acho que Hemingway está no meio do caminho. Ele estava lá de verdade, mas não estava. Mas Gorky? Ele escreveu algumas coisas fortes. Antes da Revolução. Depois da Revolução, sua obra começou a empalidecer. Não tinha muito do que falar mal. É como os que protestam contra a guerra, precisam de uma guerra para crescer. Algumas pessoas se deram bem protestando contra guerras. E quando não há uma guerra, elas não sabem o que fazer. Como durante a Guerra do Golfo. Havia um grupo de escritores, poetas; tinham planejado um enorme protesto contra a guerra, estavam prontos com seus poemas e seus discursos. De repente, a guerra terminou. E o protesto estava marcado para uma semana depois. Mas eles não cancelaram. Fizeram de qualquer forma. Porque queriam estar no palco. Precisavam disso. Foi algo como um índio fazendo a Dança da Chuva. Eu mesmo sou contra a guerra. Era contra a guerra há muito tempo atrás, quando isto não era nem mesmo uma coisa popular, decente e intelectual. Mas desconfio da coragem e dos motivos de muitos dos que protestam contra a guerra profissionalmente. De Gorky para isso, o quê? Deixe a cabeça divagar, quem se importa?
Outro bom dia no hipódromo. Não se preocupem, não estou ganhando todo o dinheiro. Geralmente, aposto US$ 10 ou US$ 20 para ganhar ou, quando acho que vou me dar muito bem, subo pra US$ 40.
Os hipódromos confundem ainda mais as pessoas. Eles têm dois caras na tv antes de cada páreo e falam sobre quem eles acham que vai ganhar. Mostram as probabilidades de cada corrida. Assim como todos os bookmakers, as barbadas e os serviços de apostas. Mesmo os computadores não conseguem determinar os cavalos, independentemente da quantidade de informações que é fornecida. Cada vez que você paga alguém para dizer a você o que deve fazer, você é um perdedor. E isto inclui seu psiquiatra, seu psicólogo, seu operador da bolsa de valores, seu professor e seu etc.
Não há nada que ensine mais do que se reorganizar depois do fracasso e seguir em frente. Mas a maioria das pessoas fica paralisada de medo. Elas têm tanto medo do fracasso que acabam fracassando. Estão condicionadas demais, acostumadas demais que digam o que devem fazer. Começa com a família, passa pela escola e entra no mundo dos negócios.
Veja, tenho alguns dias bons no hipódromo e, de repente, sei tudo.
Há uma porta aberta para a noite e estou sentado aqui, congelando, mas não vou me levantar e fechar a porta porque as palavras estão fugindo e gosto demais disso para parar. Mas, merda, eu vou. Vou levantar, fechar a porta e mijar.
Pronto, já fiz. Ambas as coisas. Até pus um blusão. Velho escritor põe blusão, senta, sorri para a tela do computador e escreve sobre a vida. Seremos tão santos? E, meu Deus, você já pensou quanto mijo uma pessoa mija durante toda a vida? O quanto ela come, caga? Toneladas. Horrível. É melhor morrermos e sairmos daqui, estamos envenenando tudo com o que expelimos. As malditas dançarinas, elas também fazem isso.
Não há cavalos amanhã. Terça-feira é um dia de folga.
Acho que vou descer e sentar com minha mulher, ver um pouco da estúpida tv. Estou sempre no hipódromo ou nesta máquina. Talvez ela goste disso. Espero. Bem, aqui vou eu. Sou um cara legal, sabe? Descer. Deve ser estranho viver comigo. É estranho pra mim.
Boa noite.
Charles Bukowski, in O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio

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