terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

09/10/91 - 12:07

A aula de computação foi um chute no saco. Você anda centímetro por centímetro e tenta entender o todo. O problema é que os livros falam de um jeito e algumas pessoas, o oposto. A terminologia se torna lentamente compreensível. O computador só faz, ele não sabe. Você pode confundi-lo e ele se voltar contra você. Depende de você se dar bem com ele. Mesmo assim, o computador pode ficar louco e fazer coisas estranhas. Pega vírus, entra em curto, congela etc. De alguma forma, esta noite, acho que quanto menos eu falar sobre o computador, melhor.
O que será que aconteceu com aquele repórter francês maluco que me entrevistou em Paris tempos atrás? Aquele que bebia uísque como a maioria das pessoas bebe cerveja? E ele ficava mais inteligente e interessante à medida que as garrafas se esvaziavam. Provavelmente morto. Eu costumava beber 15 horas por dia, mas em geral era vinho e cerveja. Eu deveria estar morto. Vou estar morto. Nada mal, pensando nisso. Tive uma existência estranha e confusa, em grande parte horrível, baixaria total. Mas acho que foi a forma com que me arrastei pela merda que fez a diferença. Hoje, olhando pra trás, acho que exibi certa compostura e classe, independentemente do que estava acontecendo. Lembro de como os caras do FBI estavam putos comigo na viagem de carro. “EI, ESSE CARA ESTÁ CALMO DEMAIS”, gritou um deles, furioso. Eu não tinha perguntado por que tinham me pegado ou para onde estávamos indo. Não me importava. Apenas mais uma fatia da falta de sentido da vida. “AGORA, ESPEREM”, disse a eles. “Estou com medo.” Isso pareceu fazer com que se sentissem melhor. Para mim, eles eram como criaturas do espaço sideral. Não conseguíamos nos relacionar. Mas era estranho. Eu não sentia nada. Bom, não era exatamente estranho para mim, quero dizer que era estranho no sentido comum. Eu via apenas mãos, pés e cabeças. Eles tinham decidido alguma coisa, dependia deles. Eu não buscava justiça ou lógica. Nunca busquei. Talvez seja por isso que nunca escrevi nada de protesto social. Para mim, a estrutura toda nunca fez nenhum sentido, seja o que fosse que fizessem com ela. Na verdade, você não pode tornar alguma coisa boa se essa coisa não existe. Aqueles caras queriam que eu demonstrasse medo, estavam acostumados a isso. Eu só estava de cara.
Aqui vou para a aula de computação. Mas é para o meu bem, brincar com as palavras, meu único brinquedo. Só meditando aqui hoje à noite. A música clássica no rádio não está muito boa. Acho que vou desligar e me sentar um pouco com minha mulher e os gatos. Nunca pressione, force a palavra. Diabos, não há disputa e, certamente, pouquíssima competição. Pouquíssima.
Charles Bukowski, in O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio

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