Todas
as características da minha técnica narrativa atual (eu preferiria
dizer: do meu estilo) provêm de um princípio básico segundo o qual
todo o “dito” se destina a ser “ouvido”. Quero com isto
significar que é como narrador oral que me vejo quando escrevo e que
as palavras são por mim escritas tanto para serem lidas como para
serem ouvidas. Ora, o narrador oral não usa pontuação, fala como
se estivesse a compor música e usa os mesmos elementos que o músico:
sons e pausas, altos e baixos, uns, breves ou longas, outras. Certas
tendências, que reconheço e confirmo (estruturas barrocas, oratória
circular, simetria de elementos), suponho que me vêm de uma certa
ideia de um discurso oral tomado como música. Pergunto-me mesmo se
não haverá mais do que uma simples coincidência entre o caráter
inorganizado e fragmentário do discurso falado de hoje e as
expressões “mínimas” de certa música contemporânea…
José
Saramago, in Cadernos de Lanzarote (1994)
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