sábado, 16 de janeiro de 2016

Batismo


Casy o fitou, pensativo.
Mais uma coisa eu quero perguntar-lhe. É uma coisa que está me torturando faz muito tempo.
Vá falando.
Bem — começou o pregador vagarosamente —, está aqui você, a quem eu batizei quando estava transbordando de crença. Naquele dia, Jesus saía de mim por todos os poros. Você não se pode lembrar, porque estava puxando as tranças daquela menina...
Me lembro, sim. Era a pequena Susy. Um ano depois, ela mordeu meu dedo.
Bem, será que lhe fez bem esse batismo? Será que tornou sua vida melhor?
Joad quedou pensativo.
Não pensei nisso.
Então, será que a tornou pior? Pense bem, será?
Joad apanhou a garrafinha de uísque e puxou um trago.
Não fez bem nem mal. Só achei a coisa engraçada. — E estendeu a garrafinha ao pastor.
Casy suspirou, bebeu longamente, percebeu que o uísque estava acabando e tornou a beber.
É bom que seja assim — disse. — Estava com medo de que tivesse prejudicado alguém com os meus hábitos.
Joad olhou em direção ao paletó e viu a tartaruguinha se libertar e começar a se mover célere de volta ao caminho de onde fora retirada. Joad a observou por um momento e apanhou-a, recolocando-a enrolada no paletó.
É o único presente que eu pude trazer para as crianças — disse.
É uma coisa engraçada. Eu estava pensando no velho Tom Joad quando você me apareceu. Pensava em visitá-lo. Antes eu pensava que ele era um homem sem Deus. Como vai o velho Tom?
Não sei. Faz quatro anos que saí de casa.
Ele não lhe escreveu?
Joad estava embaraçado.
Bom, sabe, o velho não gosta de escrever. Sabia assinar seu nome como qualquer pessoa, e até lambia a ponta do lápis. Mas nunca escreveu uma carta, em toda a vida dele. Ele sempre disse que aquilo que a gente não pode dizer com a boca também não deve escrever num papel.
John Steinbeck, in As vinhas da ira

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