Alguns
dias depois, fomos à sala de montagem. Jon Pinchot e a montadora Kay
Bronstein estavam atarefados.
Jon
puxou algumas cadeiras para nós.
– Vou
te mostrar o copião. Ainda está muito grosso, você sabe. Ainda tem
muito trabalho a fazer.
– A
gente entende – disse Sarah.
– A
gente quer fazer justiça ao seu filme – disse Kay. – Eu o adoro
mesmo!
– Obrigado
– eu disse.
– Estamos
mixando a música agora – disse Jon. – Friedman e Fischman estão
em Londres fazendo um novo acordo. Telefonam quatro ou cinco vezes
por dia, berrando: “PAREM A MIXAGEM! PAREM A MIXAGEM!”. Eu finjo
não entender. Escolhemos umas músicas sensacionais, mas os direitos
vão sair muito caros. Friedman e Fischman querem que eu use música
enlatada, que não custará nada, mas é terrível. Arruinaria o
filme! Por isso estou mixando boa música junto com a trilha sonora,
pra não poderem tirar depois...
– Você
já fez um filme nessas condições? – perguntei.
– Não.
Não existe ninguém como esses dois caras. Mas eu amo eles!
– Ama
eles?
– É,
parecem crianças. Têm coração. Mesmo quando tentam cortar a
garganta da gente, têm um certo calor. Eu preferiria mil vezes
negociar com eles do que com os advogados de corporações que
dirigem quase tudo em Hollywood.
Jon
desligou as luzes e ficamos vendo.O filme aparecia numa pequena tela,
parecendo um aparelho de TV. Passavam os créditos. Depois, vinha meu
nome. Eu fazia parte de Hollywood, pelo menos por um pequeno
instante. Era culpado.
A
coisa rolava bem. Não vi nada errado.
– Eu
gosto, eu gosto – disse.
– Temos
uma coisinha aqui – disse Jon.
Então
chegou a cena em que Jack e Francine se conhecem. Estão sentados na
ponta do balcão de um bar. Ele pagou alguns drinques para ela, que
os emborcou de vez. Jack se senta com meia garrafa de cerveja. Com a
mão direita, afasta a garrafa e diz: “É isso aí”. “É isso
aí o quê?”, pergunta Francine. Ele então explica que não tem
mais dinheiro, está quebrado, não pode pagar mais bebidas.
– NÃO!
NÃO! – eu berrei. – OH, SANTO CRISTO, NÃO!
Jon
parou o filme.
– Que
foi?
– Os
alcoólatras que virem isso vão nos expulsar da cidade às
gargalhadas.
– Que
é que há?
– Um
bebum jamais afastaria uma meia garrafa de cerveja e diria: “É
isso aí”. Ele acabaria a garrafa até a última gota, e
então diria: “É isso aí...”
– Hank
tem razão – disse Sarah. – Também notei isso...
– Eu
fiz cinco tomadas dessa cena, e achei que esta era a melhor...
– Jon,
eu me senti afrontado quando vi ele empurrar aquela garrafa
pro lado, doeu, foi como um tapa na cara!
– Acho
que tem uma cena em que tem apenas um restinho na garrafa de
cerveja...
– Mesmo
um restinho é muito, mas por favor use essa, se tem mesmo – eu
disse.
Era
o que podia acontecer, quando se tinha um diretor não alcoólatra e
um ator que detestava bebida, e os dois trabalhavam no mesmo filme. E
um escritor alcoólatra, que preferia estar nas corridas a estar no
set.
Vimos
o resto do filme.
Jon
acendeu as luzes.
– Que
tal? Quer dizer, ainda está muito grosso, você sabe...
– A
música e o trabalho de câmera foram sensacionais – disse Sarah.
– Baby,
que tal o texto? – perguntei.
– Chinaski
está bom como sempre – ela disse.
– Obrigado
– eu disse.
– Todo
o elenco e a equipe tinham sempre você em mente – disse Kay –,
mesmo quando você não estava lá.
– Ah
– eu disse.
– Mas,
Hank, que foi que você achou? – perguntou Jon.
– Gostei
do desempenho de Jack. Acho que Francine precisa de um pouco mais de
óleo nas juntas.
– Francine
estava muito boa – disse Jon. – O filme realmente ganha vida
quando ela aparece.
– Talvez.
De qualquer modo, estou feliz por fazer parte do filme e do grande
retorno dela...
Assim,
para comemorar nossos bons sentimentos, trancamos a sala de montagem,
tomamos o elevador e saímos para a rua, entramos no meu carro e
fomos comer. Não no Musso’s desta vez, mas num lugar mais perto,
um restaurante cerca de oito quadras a oeste. Era curioso, eu
pensava, como as coisas se fazem. Apenas um dia de cada vez, dia após
dia, e então, lá estava. Num certo sentido, eu me sentia como se
ainda não tivesse escrito o argumento. Não escreveu, diria um
crítico, enquanto não perceber o ruim e o óbvio em seu texto. Mas
qual era a diferença entre um crítico de cinema e um espectador de
cinema? Resposta: o crítico não precisava pagar.
– Encoste
ali – disse Jon –, é o lugar!
Encostei.
Charles Bukowski, in Hollywood
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