Wilton quase
engoliu a pedra de gelo do uisquinho:
- Elas querem o
quê?!
- Calma, Wilton.
Olha a pressão...
- Repete, Marilza.
Eu não devo ter ouvido bem.
- Ai, meu Deus! Não
fica assim, Tico!
- Não me chame por
esse apelidinho idiota. Repete o que tu falou. Repete que é pra ver
se eu não tô maluco.
- Chega de drama,
Wilton! Elas são meninas normais As coleguinhas na escola falam no
assunto, juram que já viram e é perfeitamente natural que elas
queiram ver também, pombas!
- Eu não acho nada
natural que elas, aos treze e aos quinze anos, queiram ver pombas e
pembas!
- Olha o nível,
Wilton, olha o nível!
- Nível? Você vem
me dizer que minhas filhas querem ver um filme pornô no meu vídeo e
ainda tem a coragem de falar em nível?
- Tudo bem, Wilton.
Se você prefere que elas aceitem o convite de um desses jogadores de
futebol do conjunto, tudo bem.
- Convite?! Eu mato
um cachorro desses! Eu...
- Por favor,
Wilton! Me escuta, cara! Me ouve, ao menos uma vez na vida ! Nós
temos uma porrada de fitas dessas, né? É só selecionar uma
menos... menos... traumatizante. Nada de chicote, vibrador, anão
bem-dotado...
- Péra lá,
Marilza! Que história é essa de anão bem-dotado? Eu não tenho
fita com anão. Onde é que tu viu isso?
- Era só um
exemplo, meu nego. A gente escolhe uma fita mais soft, faz o desejo
delas, o troço perde o mistério e pronto! Elas cantam marra com as
coleguinhas, também já vimos etc., e fica tudo na maior limpeza.
Qualé, Wilton? Eles vêem pornô até na Escola Superior de Guerra,
né? É moda, querido. Feito a vizinha do 801: dá e passa!
Wilton renovou a
dose e os dois partiram pra seleção:
- Hum... tô me
sentindo meio Brossard...
- E daí? Eu também
tô dando uma de Dona Solange, não tô? Fica frio.
A primeira fita
selecionada por Wilton era uma tal de Suzy’s Centerfolds. Marilza
vetou:
- Masturbação
não!
- Ué, mas isso é
o que elas mais fazem!
- Mas não há
necessidade de aprenderem novas técnicas com essas louças. Uma
coisa é a masturbação como um estágio do desenvolvimento sexual
normal das minhas meninas, certo? Agora, piranha tocando siririca
profissional é outro departamento.
- É a minha vez de
dizer: olha o nível!
- Desculpe.
- Tem essa outra
aqui: Superwoman. É uma sátira. Pode ser que o clima de
gozação atenue a brabeira.
- Acontece aquela
coisa horrorosa de espirrar na cara da mulher?
- Espirrar?
- Não banca o
gaiato, Wilton! Você sabe de que qui eu tô falando... - Ora,
Marilza, esses lances são quase obrigatórios nesses filmecos. São
o creme, rá, rá, rá!... Não precisa me olhar com essa cara...
Acabaram resolvendo
botar só um trecho de um filme não muito explícito, metido a
artístico, City Heat ou coisa parecida.
Marilza fez uma
exposição preliminar sobre enamoramento, amor, escolhas insensatas,
complexo de Cinderela, Mariazinhas, prós e contras da obra de Milan
Kundera e encerrou, brilhantemente, estabelecendo um paralelo entre
pornografia barata e a lavagem de roupa suja nos debates políticos.
Wilton apertou a
tecla play e recolheu-se ao banheiro, acometido de avassaladora
diarréia. A fita correu. Lá pelas tantas, Helô comentou com
Nandinha:
- Tô achando o pau
desse cara meio barro, meio tijolo.
- Podes crer. Desde
o 69 que tá assim.
- Também ela mamou
mal paca.
- Não sabe prender
entre a língua e o céu da boca.
Não temos o resto
da conversinha. Wilton tá no Miguel Couto, onde o tubarão virou
boto, e a Marilza foi pro Pedro Emesto, onde tu entra Maluf e sai
honesto.
Aldir Blanc,
in Brasil passado a sujo