“Ninguém
se trocaria por um dos seus semelhantes, mas todos se trocariam pelo
seu sonho. Porque o homem quer conquistar, mas sem deixar de se
possuir. Deseja a continuidade do eu e, juntamente, a sua metamorfose
- pretensão contraditória que constitui um dos episódios do eterno
automatismo.
O
homem ama-se e desama-se. Diante dos outros, mostra-se quase sempre
satisfeito consigo - com medo de ser ultrapassado ou emulado -, mas
quando está só com o seu eu, experimenta um tédio, uma repulsa,
uma repugnância, que em regra se transformam em desejo de
transformação. Nem todos são capazes de se contemplar sem adulação
até às últimas raízes e reconhecer, ainda que no sigilo da alma,
a sua miséria, mas quase todos têm a sua sensação e, com
frequência, a certeza - o tédio de si pode notar-se mesmo sem as
formas do juízo. E os outros instintos - soberba, gula do mais e do
novo - ajudam a desejar a mudança. Existe com frequência em nós o
narcisismo, mas o espelho é sempre colocado no passado e no futuro -
no presente, nunca.”
Giovanni
Papini, in Relatório sobre os homens
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