domingo, 2 de abril de 2023

Maracatu atômico | Nélson Jacobina e Jorge Mautner, 1974


Filho de um judeu austríaco e uma católica iugoslava refugiados do nazismo, o poeta, romancista e filósofo Jorge Mautner nasceu no Rio do Janeiro, em 1941, onde viveu até os 7 anos. Até se mudar para São Paulo, com a mãe e seu segundo marido, um violinista, o garoto conviveu intensamente no mundo do candomblé levado por sua babá, que era uma ialorixá. Estudioso de Marx e Nietzsche, surgiu como um fenômeno ao ganhar, aos 21 anos, o maior prêmio literário brasileiro, o Jabuti, com seu romance de estreia, Deus da chuva e da morte. Comunista, com o golpe de 1964 foi preso e se exilou em Nova York, onde viveu a explosão do pop, e depois em Londres, onde se aproximou de Gilberto Gil e Caetano Veloso.
De volta ao Brasil, Mautner, que, em 1966, já tinha lançado um compacto simples com as músicas “Radioatividade” e “Não, não, não”, encontrou no jovem violonista carioca Nélson Jacobina (1953-2012) o seu parceiro ideal. Em 1974, Gilberto Gil deu seu aval à qualidade da dupla gravando “Maracatu atômico”, com grande execução nas rádios. Enquanto a música de Jacobina estilizava e modernizava os ritmos do maracatu pernambucano, a letra de Jorge fundia o atômico ao primitivo e o humor pop ao expressionismo alemão. Receita de aparente complexidade que resultou num grande sucesso popular.
Atrás do arranha-céu tem o céu, tem o céu / E depois tem outro céu sem estrelas / Em cima do guarda-chuva, tem a chuva, tem a chuva / Que tem gotas tão lindas que até dá vontade de comê-las.”
Vinte e dois anos depois, os pernambucanos Chico Science e Nação Zumbi, maior revelação da música brasileira nos anos 1990, produziram uma sensacional regravação da música de Jacobina e Mautner como um heavy maracatu futurista, com base rítmica ultrapesada envolvida pelos timbres rascantes das guitarras e dos beats eletrônicos. Reunindo o primitivo regional com as raízes africanas e os sons planetários, “Maracatu atômico” sintetizava o Mangue Beat e se tornou um clássico do pop brasileiro.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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