Mas,
com a breca! quem me explicará a razão desta diferença?
Um
dia vimo-nos, tratamos o casamento, desfizemo-lo e separamo-nos, a
frio, sem dor, porque não houvera paixão nenhuma; mordeu-me apenas
algum despeito e nada mais.
Correm
anos, torno a vê-la, damos três ou quatro giros de valsa, e eis-nos
a amar um ao outro com delírio. A beleza de Virgília chegara, é
certo, a um alto grau de apuro, mas nós éramos substancialmente os
mesmos, e eu, à minha parte, não me tornara mais bonito nem mais
elegante. Quem me explicará a razão dessa diferença?
A
razão não podia ser outra senão o momento oportuno. Não era
oportuno o primeiro momento, porque, se nenhum de nós estava verde
para o amor, ambos o estávamos para o nosso amor; distinção
fundamental. Não há amor possível sem a oportunidade dos sujeitos.
Esta explicação achei-a eu mesmo, dois anos depois do beijo, um dia
que Virgília se me queixava de um pintalegrete que lá ia e
tenazmente a galanteava.
– Que
importuno! dizia ela fazendo uma careta de raiva.
Estremeci,
fitei-a, vi que a indignação era sincera; então ocorreu-me que
talvez eu tivesse provocado alguma vez aquela mesma careta, e
compreendi logo toda a grandeza da minha evolução. Tinha vindo de
importuno a oportuno.
Machado de Assis, in Memórias Póstumas de Brás Cubas
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