domingo, 3 de julho de 2022

Balada | XIV

Fui monja
vestida de negro
em labirinto azul.

Antes do Ser
havia um homem
consciente
destruindo o lirismo
descuidado
das minhas madrugadas.

Estava presente
nas conversas dos bares
solitárias histórias.
Estava presente
na fusão dos homens medíocres
e dos homens sem cor.

Em azul e negro
eu vi o esboço
de um caso triste,
aquele doido
procurando as mãos.
As mãos que deixara
sobre alguma mesa
de mármore azulado
em algum labirinto azul.

Andei tanto por corredores vazios
que nas minhas chagas
não existem pés.
Inconsciente monja vestida de negro,
teus cabelos eram feitos de conchas,
teu véu de redes do mar.
Entre os dedos tinhas contas coloridas.
Mas, havia um homem
consciente
destruindo o lirismo
das tuas madrugadas.

Morreu o mundo das monjas.
Morreu o mundo das mãos.
Sou doida desfigurada
procurando mãos
mergulhadas em azul.

Sou quase morta
no descanso estéril
da cor negra.

Hilda Hilst, in Baladas

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