Respondi que eu gostaria mesmo era de
poder um dia afinal escrever uma história que começasse assim: “Era
uma vez...” Para crianças? Perguntaram. Não, para adultos mesmo,
respondi já distraída, ocupada em lembrar-me de minhas primeiras
histórias aos sete anos, todas começando com “era uma vez”. Eu
as enviava para a página infantil das quintas-feiras no jornal de
Recife, e nenhuma, mas nenhuma mesmo, foi jamais publicada. E mesmo
então era fácil de ver por quê. Nenhuma contava propriamente uma
história com os fatos necessários a uma história. Eu lia todas as
que eles publicavam, e todas relatavam um acontecimento. Mas se eles
eram teimosos, eu também.
Desde então, porém, eu havia mudado
tanto, quem sabe agora já estava pronta para o verdadeiro “era uma
vez”. Perguntei-me em seguida: e por que não começo? agora mesmo?
Será simples, senti eu.
E comecei. No entanto, ao ter escrito a
primeira frase, vi imediatamente que ainda me era impossível. Eu
havia escrito: “Era uma vez um pássaro, meu Deus.”
Clarice Lispector, in Crônicas para jovens: de escrita e vida
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