Eu, minha mãe, meu pai, minha irmã (Su)
e meu cachorro (Dogman) fomos fazer camping. Meu pai decidiu fazer
camping este ano porque disse que estava na hora de a gente conhecer
a natureza de perto, já que eu, a minha irmã (Su) e o meu cachorro
(Dogman) nascemos em apartamento, e, até os 5 anos de idade, sempre
que via um passarinho numa árvore, eu gritava “aquele fugiu!” e
corria para avisar um guarda; mas eu acho que meu pai decidiu fazer
camping depois que viu o preço dos hotéis, apesar de a minha mãe
avisar que, na primeira vez que aparecesse uma cobra, ela voltaria
para casa correndo, e a minha irmã (Su) insistir em levar o
toca-discos e toda a coleção de discos dela, mesmo o meu pai
dizendo que aonde nós íamos não teria corrente elétrica, o que
deixou minha irmã (Su) muito irritada, porque, se não tinha
corrente elétrica, como ela ia usar o secador de cabelo? Mas eu e o
meu cachorro (Dogman) gostamos porque o meu pai disse que nós íamos
pescar, e cozinhar nós mesmos o peixe pescado no fogo, e comer o
peixe com as mãos, e se há uma coisa que eu gosto é confusão.
Foi muito engraçado o dia em que minha
mãe abriu a porta do carro bem devagar, espiando embaixo do banco
com cuidado e perguntando “será que não tem cobra?”, e o meu
pai perdeu a paciência e disse “entra no carro e vamos embora”,
porque nós ainda nem tínhamos saído da garagem do edifício. Na
estrada tinha tanto buraco que o carro quase quebrou, e nós
atrasamos, e quando chegamos ao local do camping já era noite, e o
meu pai disse “este parece ser um bom lugar, com bastante grama e
perto da água”, e decidimos deixar para armar a barraca no dia
seguinte e dormir dentro do carro mesmo; só que não conseguimos
dormir porque o meu cachorro (Dogman) passou a noite inteira querendo
sair do carro, mas a minha mãe não deixava abrirem a porta, com
medo de cobra; e no dia seguinte tinha a cara feia de um homem nos
espiando pela janela, porque nós tínhamos estacionado o carro no
quintal da casa dele, e a água que o meu pai viu era a piscina dele
e tivemos que sair correndo. No fim conseguimos um bom lugar para
armar a barraca, perto de um rio. Levamos dois dias para armar a
barraca, porque a minha mãe tinha usado o manual de instruções
para limpar umas porcarias que o meu cachorro (Dogman) fez dentro do
carro, mas ficou bem legal, mesmo que o zíper da porta não
funcionasse e para entrar ou sair da barraca a gente tivesse que
desmanchar tudo e depois armar de novo. O rio tinha um cheiro ruim, e
o primeiro peixe que nós pescamos já saiu da água cozinhado, mas
não deu para comer, e o melhor de tudo é que choveu muito, e a água
do rio subiu, e nós voltamos pra casa flutuando, o que foi muito
melhor que voltar pela estrada esburacada; quer dizer que no fim tudo
deu certo.
Luís Fernando Veríssimo, in O santinho
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