Desculpem, senhores editores das revistas
masculinas, mas não quero saber de conselhos para se alcançar um
corpo malhadão. A barriga tábua-de-tanque é dom de quem tem, não
insistam em torná-la item obrigatório para ser homem nestes tempos.
Não capitularemos ao ridículo.
Muito menos peçam, como vi numa revista,
para se perder a vergonha de tratar com os amigos sobre os cremes que
estamos carregando escondidos na maleta, como se eu e o Arnaldo Jabor
admitíssemos carregar outra coisa conosco que não um volume
qualquer do Bukowski, um canivete suíço e o par de joelheiras para
um time-contra no Aterro. Mudamos, nem sempre por iniciativa própria,
mas vamos com calma. Temos um Zé do Boné a zelar. Ainda não será
dessa vez que receberemos de vocês, Moisés dos aquários das
Redações, a tábua com as dez melhores cantadas a se dar numa
mulher ou como abrir com estilo contemporâneo a porta de um
single-bar. Temos nossas próprias manhas. Relaxem.
São muitas revistas dizendo que tipo de
flor entregar, o que cozinhar para ela no primeiro encontro (esqueça
o amendoim, deixa cascas nos dentes). Dos conselhos de homem que
tenho ouvido, prefiro seguir exclusivamente a sabedoria do flanelinha
– “deixa solto, doutor”. É o que tenho feito. Se o mocassim
colorido combina com jeans customizado? Por favor, senhores.
Eu sou do tempo em que o exercício da
masculinidade plena era atividade simples, algo que precisava como
apêndice estético apenas do apoio de um bom pente Flamengo e,
pronto - deixa a vida me levar. Milhões de homens passaram felizes
suas existências balizados por uma única filosofia: “Dura lex,
sed lex, no cabelo só Gumex”. Infelizmente, já era. Complicou.
Tenho visto cada vez mais revistas especializadas em dizer como o
homem, se gordo, deve se vestir de preto para anular as adiposidades
ao redor da barriga, e se de cabelos finos, como torná-los mais
cheios com o xampu de ovo transgênico.
Ora, senhores editores dessa nova
tendência das bancas, me poupem os poros. Acabei de limpá-los com o
Clay Mask da Zirh. É uma loção relaxante, mas não o suficiente
para me obnubilar a razão.
Seria reduzir demais o espectro de uma
revista masculina deixá-la em eterno rodízio pelo corpo das deusas
nuas e piadas de loura. Nada contra ampliar a pauta. Mas eis que se
volta contra o macho, este que ainda há pouco ria da Nova e
da Cláudia por estabelecerem para suas leitoras a
obrigatoriedade de a cada estação do ano trocarem o tamanho dos
seios – eis que se volta contra o macho a mesma ditadura. Ei,
garotos, agora depilem os pêlos do peito. Ótimo. Agora vamos
aplicar um silicone no peitoral.
Leio nessas revistas que ficou
absolutamente impossível continuar homem no século XXI sem ter
feito, por exemplo, um curso de vinho e saber a temperatura ideal
para servi-lo. Não tenho a mínima ideia de que uva é feito o
branco – e não arvoro aqui qualquer orgulho especial pela
ignorância. Só quero ser dispensado, como até ontem, da súbita
obrigatoriedade de frequentar esse vestibular cafona para ganhar
inclusão sexual.
Repara só: como são de safra triste os
senhores que, treinados a dispensar com elegância o cangote da
moças, tentam seduzir cheirando a rolha.
As revistas masculinas, quase todas
editadas por mulheres, estão ensinando o homem a aplacar a
testosterona, suavizar o instinto e trabalhar a pegada de jeito menos
extravagante. Querem-no sensível e ouvinte do que elas têm a dizer.
Sejam românticos, rapazes, liguem no dia seguinte. É o contrário
das mensais femininas, que obrigaram a mulherada a um papel mais
agressivo. Recuperem o tempo perdido, tigresas. Caiam matando,
guerreiras. Querem-nas turbinadas e assumindo o controle da situação.
Como são infelizes homens e mulheres que pautam suas vidas pelas
pautas dos editores de revistas.
Gerações inteiras de fortões achavam
que bastava apertar um punho contra o outro, o método Atlas da Força
Aérea Canadense, e elas se renderiam. Podia até ser, mas só até
anteontem. Acabei de ler na banca: excesso de músculos cheira a
falta de masculinidade.
Elas detestam marombados. Pior: mulheres
gostariam que seus amigos gays fossem héteros, pois estão num
momento em que cultuam machos sensíveis. Não aconselho meus pares a
correrem atrás. Quando você, para entrar no perfil da moda, estiver
acabando de ler toda a poesia de Bandeira, é bem provável que elas
já tenham sido convocadas a preferirem o novo cafaja da novela das
oito.
Machos, líderes, campeões, já soubemos
de tudo. Hoje somos convencidos pelos sabichões da press de que não
passamos de uns pobres coitados ignorantes das coisas da vida,
compradores de revistas em busca de dicas espertas. Que roupa se deve
usar para agradar a uma mulher no primeiro encontro? Cuidado para não
estar mais perfumado do que ela.
Uma dessas publicações, que tenta
ensinar o homem a se comportar segundo os novos valores da pele
hidratada, lista cinquenta coisas sobre elas que ele, o
papai-sabe-tudo na televisão de outrora, não sabe mais. Aqueles
beijos que levavam nas orelhas e pareciam se derreter todas? Pois
então. Depois de anos conformadas em se deixarem lambuzar, elas
tomaram coragem para dizer. De-tes-tam. Inventem outra, rapazes.
Conheci mulheres, vítimas da opressão
editorial, que começaram a semana com as unhas azuis e sexta-feira,
quando saiu a nova edição da revista, precisaram trocar para o
rosa-escuro. Outras, sexualmente tímidas, foram convencidas de que
estavam fora de seu tempo e convocadas a colocar fogo no colchão,
ou, quem sabe, na própria mesa do chefe. Os homens são as novas
vítimas. Flagrados no contrapé, no momento em que boa parte deles
ainda emula o Brucutu e puxa a Hula pelo cabelo nas boates, eles
piscam inseguros diante das novas ordens. Revelem suas emoções,
rapazes, mas em seguida corram ao dermatologista e providenciem um
botox básico para aliviar as marcas de tanta expressão de carinho,
amor e compreensão.
Caçar javali, Santo Asterix, socorrei!,
era mais fácil.
Joaquim Ferreira dos Santos, in Em busca do borogodó perdido
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