Uma
grande amiga minha se deu ao trabalho de ir anotando numa folha de
papel o que eu lhe dizia numa conversa telefônica. Deu-me depois a
folha e eu me estranhei, reconhecendo-me ao mesmo tempo. Estava
escrito: “Eu às vezes tenho a sensação de que estou procurando
às cegas uma coisa; eu quero continuar, eu me sinto obrigada a
continuar. Sinto até uma certa coragem de fazê-lo. O meu temor é
de que seja tudo muito novo para mim, que eu talvez possa encontrar o
que não quero. Essa coragem eu teria, mas o preço é muito alto, o
preço é muito caro, e eu estou cansada. Sempre paguei e de repente
não quero mais. Sinto que tenho que ir para um lado ou para outro.
Ou para uma desistência: levar uma vida mais humilde de espírito,
ou então não sei em que ramo a desistência, não sei em que lugar
encontrar a tarefa, a doçura, a coisa. Estou viciada em viver nessa
extrema intensidade. A hora de escrever é o reflexo de uma situação
toda minha. É quando sinto o maior desamparo.”
Clarice
Lispector,
in
Crônicas para
jovens: de escrita e vida
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