“Minhas
intuições se tornam mais claras ao esforço de transpô-las em
palavras.” Isso eu escrevi uma vez. Mas está errado, pois que, ao
escrever, grudada e colada, está a intuição. É perigoso porque
nunca se sabe o que virá — se se for sincero. Pode vir o aviso de
uma destruição, de uma autodestruição por meio de palavras. Podem
vir lembranças que jamais se queria vê-las à tona. O clima pode se
tornar apocalíptico. O coração tem que estar puro para que a
intuição venha. E quando, meu Deus, pode-se dizer que o coração
está puro? Porque é difícil apurar a pureza: às vezes no amor
ilícito está toda a pureza do corpo e alma, não abençoado por um
padre, mas abençoado pelo próprio amor. E tudo isso pode-se chegar
a ver — e ter visto é irrevogável. Não se brinca com a intuição,
não se brinca com o escrever: a caça pode ferir mortalmente o
caçador.
Clarice
Lispector,
in Crônicas para
jovens: de escrita e vida
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