domingo, 26 de maio de 2019

Cores de parto

O que eu vi,
à nascença, foi o céu.

No rasgão da retina,
a desatada luz: o meu segundo oceano.

Aprendi a ser cego
antes de, em linha e cor,
o mundo se revelar.

O que depois vi,
ainda sem saber que via,
foram as mãos.

Parteiros gestos
me ensinaram quanto,
das mãos,
a vida inteira vamos nascendo.

As mãos foram, assim,
o meu segundo ventre.

Luz e mãos
moldaram a impossível fronteira
entre oceano e ventre.
Mia Couto

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